A confiança é uma necessidade básica da criança, assim como a alimentação nutre seu corpo em desenvolvimento, um sentimento amoroso e afetivo irá nutri-la emocionalmente.
Nos primeiros anos de vida, o papel afetivo, principalmente a função materna, é fundamental para que os alicerces psíquicos sejam construídos em uma base sólida e segura, para que na idade adulta esta possa ser uma das garantias para uma vida mais equilibrada e com estrutura psíquica necessária para o enfrentamento das adversidades que a vida impõe.
De acordo com a psicóloga Cláudia Sbaraini, vários estudos com crianças em idade precoce têm demonstrado o quanto a privação afetiva, principalmente a privação materna nos primeiros anos de vida de um bebê, pode ser prejudicial ao desenvolvimento emocional de um indivíduo. Por isso, ela sentencia: “Quanto mais cedo for a ausência de afeto, mais prejudicial ela se torna. Crianças com menos de seis meses, quando separadas de sua mãe, sofrem um perda severa, pois nesta idade ainda não são seres individualizados e não se diferenciam da mãe – para o bebê a mãe faz parte de seu interior. A criança saudável busca laços de apego e afeto com seus cuidadores para sentir-se segura e protegida. Na adolescência e na vida adulta, esses laços persistem, porém, são complementados por outras relações.”
Cláudia alerta que as consequências da ausência de afeto podem ser o estopim de uma série de psicopatologias, como comportamentos agressivos, sentimentos depressivos, transtornos de personalidade, transtornos afetivos e transtornos de conduta, que se iniciam na infância e estendem-se até a vida adulta.
A relação mãe e filho
Como exemplo real da consequência da ausência de afeto nos primeiros anos de vida. a psicóloga cita o livro Precisamos falar sobre Kevin. Narrada pela própria mãe do menino americano, a história real revela a dificuldade de uma mãe em ser mãe. Desde o início de sua gravidez, não houve o desejo de ser mãe. Ao ter seu filho, não conseguiu empatizar com as necessidades de seu bebê, sendo que a relação mãe-filho foi sendo construída por sentimentos de rejeição por parte de ambos, estabelecendo-se um relacionamento baseado em raiva e hostilidade. Já nos primeiros anos de vida de Kevin, houve uma separação afetiva muito grande entre ele e sua mãe. Kevin cresceu sendo um menino frio emocionalmente e muito perverso. Quando adolescente, matou vários colegas de escola, assim como matou seu pai e sua irmã, deixando sua mãe sozinha e hostilizada por toda a sociedade.
Cláudia explica que a história de Kevin é um exemplo bastante extremo de como uma privação de afeto pode interferir no desenvolvimento afetivo de uma pessoa, mas podem existir certas nuances na personalidade de um indivíduo que demonstram que houve uma ausência e privação de afeto nestes primeiros anos: “Pessoas inseguras, frias emocionalmente, desconfiadas, agressivas e depressivas, talvez sejam alguns casos mais amenos que indiquem que possa ter havido algum prejuízo neste primeiro vínculo estabelecido entre a criança e seu cuidador. As consequências extremas desta privação podem ser as psicoses mais sérias ou em casos menos severos os distúrbios de personalidade mais adaptados socialmente.”
Ela informa ainda que estudos científicos têm até relacionado a falta de afeto na infância com problemas de crescimento, em que crianças órfãs e que sofreram sérios abandonos na infância também pararam de crescer, principalmente em função do estresse e ansiedade constantes que elas sofreram. Consequentemente o estresse altera todo o equilíbrio do corpo, alterando também as funções hormonais, conclui.