Alguns jornais costumam publicar uma coluna com registros de nascimento. Não me refiro aos anúncios pagos. Falo daquelas colunas com informações: dia de nascimento, nome da criança, filiação e domicílio dos pais, que dão conta do movimento demográfico da comunidade. Em geral, quase ao lado, aparece a lista dos óbitos, com organização parecida, dados igualmente sucintos.
Mais do que tudo, ali se apresenta o ciclo da vida, a marcha dos homens. Alguns chegam, alguns partem. A festa do início, a tristeza do fim.
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Tenho por hábito passar os olhos pelos nascimentos e óbitos. De vez em quando encontro notícias sobre pessoas que conheço. Arrisco estimativas sobre longevidade, imagino quais sejam as taxas locais de natalidade. Acho interessante também observar quais nomes são mais comuns, seja entre os que morrem, seja entre os que nascem. Observo os nomes da moda. A maneira como são escritos, as combinações que se fazem, coisas assim.
É frequente encontrar crianças recebendo nomes que imitam na escrita a maneira como são pronunciados. Essas crianças devem ter pais com gosto por filmes estrangeiros. E pais que não se importam de seguir a grafia oficial, escrevem do mesmo jeito que ouvem pronunciar. Provavelmente escolhem o nome dos heróis e heroínas cujas vidas gostariam de viver…
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O que estou querendo dizer é que as listas de nascimentos e óbitos proporcionam um passatempo comprido.
Mas tem uma coisa que dói encontrar. Dói encontrar os filhos da mãe. Sim, também aparecem os filhos unicamente da mãe. Aquelas crianças que só tem o nome materno colocado ali junto delas. Nada de pai. O pai não existe.
Desapareceu? Ninguém sabe quem é? Não aceita ser pai? Foi tirado de cena? Não teve coragem de ser? O que é que acontece?
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O bebê bem poderia ser poupado desta falta inicial.
Mas.
Mas vai crescer e vai descobrir que a vida está cheia de faltas. Outras faltas virão, isto é certo. Haverá outras dores. Sempre há dores na vida. E, às vezes, aparecem até compensações. Talvez a mãe consiga ser pai e ser mãe de um jeito bacana. Talvez o bebê tenha avós generosos, parentes dispostos a ajudar a crescer. Talvez haja muito amor para receber esta vida que vem.
Por isso o que faço é levantar os olhos da página e entrar na torcida. Tomara que a carência ajude a puxar para a frente. E aquilo que parecia desvantagem acabe somando a favor. Tomara.