Seis horas da manhã, primeira segunda-feira do último mês do ano. Ligo o rádio que despeja uma bomba no meu ouvido: “Combustível aumenta até o dobro nos postos de abastecimento”. Levanto, olho pela janela. Enxergo nuvens carregadas, lembro das despesas de fim de ano à vista – seguro do carro, IPTU, IPVA.
A semana não poderia começar pior. Ao entrar no banho lembrei-me do tempo que o país tomava conhecimento dos aumentos dos combustíveis através do Jornal Nacional. A manchete lida com a voz grave de Cid Moreira rebombava país afora e deflagrava uma desvairada corrida aos postos. Filas imensas serpenteavam ruas, quarteirões, bairros inteiros. A imprensa registrava brigas alucinadas em busca da economia de alguns cruzeiros, cruzados, seja qual era a moeda vigente.
Os aumentos sangravam sem dó o bolso do contribuinte. Mesmo no tempo do tabelamento – que provocava o súbito desaparecimento dos produtos à disposição dos consumidores – os reajustes pesavam no cálculo da inflação galopante, sem falar nos estragos no orçamento doméstico.
A auto-regulamentação do mercado, através da propalada livre concorrência, constitui utopia quando o assunto é combustível. Assim que explode um aumento, um ou outro posto, nos primeiros dias, usa a imprensa para aumentar as vendas. A estratégia reza que, em seguida, usa-se o argumento de que “a grande procura acabou com os estoques,” pondo fim à alegria dos motoristas.
2014 é ano de eleições e certamente não teremos reajustes deste quilate
Também pelo rádio ouvi representantes da Agência Nacional do Petróleo e das entidades que deveriam defender o consumidor, e concluí com base numa velha premissa: quem pode mais, chora menos, sagrada lei do mercado.
Vamos gastar cerca de 6% a mais para abastecer, um índice bem maior que o autorizado pelas autoridades que vivem exilados em Brasília, a Ilha da Fantasia. Isso, talvez, seja dos males o menor. O pior é que todos os produtos, bens e serviços – rigorosamente todos! – de agora em diante, serão reajustados com base na esfarrapada desculpa do aumento do binômio gasolina/diesel.
O malfadado “repasse dos custos ao consumidor” é um estranho movimento jamais explicado da economia que acontece apenas num sentido. Quando os preços internacionais do petróleo baixavam, por exemplo, jamais se viu decréscimo no valor de qualquer mercadoria, imposto ou tarifa.
Reina grande expectativa – como diriam os narradores de antão – sobre os reflexos desta bomba de começo de mês no cálculo da inflação. Melhor seria perguntar se os índices serão maquilados para salvar as previsões inflacionárias.
É bom lembrar que 2014 é ano eleitoral. Portanto, esta “notícia ruim” para o contribuinte será facilmente esquecida às vésperas da eleição. Afinal, se o aumento fosse concedido em janeiro ou fevereiro, a inflação do ano que vem seria diretamente afetada. Nada muda, tudo se repete…