Trabalhei por nove anos na editoria de Geral do jornal Zero Hora. Fazíamos de tudo. Curti (e fui vítima, como verão) a moda dos cometas, algo totalmente desconhecido para mim. Mas repórter que se preza não rejeita pauta. Naquela época – década de 80/90 – o “Google” que dispúnhamos eram alguns exemplares de poucos jornais do centro do país, presos em varetas de madeira por dois parafusos.
Recém-vindo do interior, meu segredo de sobrevivência era manter um bom relacionamento com os veteranos da redação. Eles sempre tinham uma dica sobre fontes úteis sobre qualquer tema. Consultei dois colegas com larga ficha de serviços jornalísticos. Eles foram unânimes em indicar um professor pós-graduado que sabia tudo de astronomia e que lecionara no exterior.
Foram semanas de tentativas até a confirmação da entrevista. Neste período devorei tudo sobre o surgimento, trajetória e função dos cometas que fascinam o homem desde a antiguidade. Cheguei tenso à universidade onde o astrônomo lecionava. E ele não ajudou em nada para quebrar o gelo. Era um intelectual, palavreado rebuscado inacessível a mortais comuns.
Uma gafe do tamanho do universo acabou com a preciosa entrevista!
Fiz um grande elogio ao trabalho dos astrônomos, tergiversando sobre o verdadeiro tema da entrevista, mas tentativa foi frustrante. O professor não escondeu a irritação. Propôs “entrar logo no assunto porque tenho muitas aulas até a noite”. Resolvi ser objetivo e encaminhei a primeira pergunta:
– Como o senhor, um estudioso, de renome internacional, encara este súbito interesse pelo trabalho dos astrólogos?
Enquanto eu sorria amarelo, o cientista me fulminou com os olhos que quase partiram meus óculos.
– Meu senhor! Eu sou astrônomo, estudo o cosmos e não faço mapa astral!
Eu não tinha noção da gafe. Ignorei a mancada e segui adiante. Era difícil compreender o que meu entrevistado dizia. Além da sofisticação do tema, ele tinha a “língua presa”, piorando o clima.
Depois de responder a primeira pergunta – repleta de ironias do tipo “é incrível como tem gente ignorante que não entende o nosso trabalho” – o entrevistado ouviu outra pergunta, feita no capricho:
– O universo, em toda a sua grandeza, certamente representa um desafio permanente. O senhor, como astrólogo, não se sente frustrado em saber que se trata de uma tarefa infinita?
Antes de chutar uma cadeira ele disparou:
– Sem dúvida a tarefa mais infinita é adestrar um quadrúpede analfabeto e diplomado cujo passatempo é empacar a vida daqueles que querem trabalhar!
Bateu a porta às suas costas. E eu, que já redigi horóscopo no começo de carreira como jornalista (vide post anterior) não entendi porque tamanha fúria…

