Somente na semana passada consegui assistir, do princípio ao fim, sem atender telefone ou mirar a rede social, o filme italiano “A Grande Beleza”. Vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro no ano passado, o longa dirigido por Paolo Sorrentino, trata das reflexões sobre a vida de um escritor, Jep Gambardella (Toni Servillo), ao completar 65 anos. É verão em Roma, ele mora em um elegante apartamento, no coração da capital italiana, mas está inquieto.
Na verdade é autor de um grande e único sucesso, o romance “O Aparelho Humano”, que escrevera décadas atrás. Envolvido com a vida mundana, não conseguiu concluir nenhum outro livro, dedicando-se a uma bem sucedida carreira de jornalista social, onde decide quem é quem nas altas rodas, usufruindo dos privilégios de sua fama.
Mas a repentina volta à lembrança de um primeiro amor, ainda na juventude, o leva a questionar o mundo, dos que o cercam e que antes assistia com indiferença ou cinismo. Homens e mulheres, empresários, nobres falidos, religiosos, são vistos de uma maneira aguda por Jep, em sua busca, não pelo tempo perdido, mas pelas coisas que realmente importam. Aos 65, percebe que aceitar o que não lhe agrada, é um perigoso tempo perdido.
O diretor Sorrentino não julga seus personagens. Deixa para quem assiste, uma desconfortável liberdade para decidir entre o certo e errado. E ainda nos permite um olhar atento, às nossas próprias vidas. Não precisamos estar em Roma para agir feito os romanos. Aqui mesmo nos deparamos com gente e vidas semelhantes. Quantos projetos perdidos, quanta palavra desperdiçada em troca do reconhecimento que vira uma imagem desbotada, logo ali adiante.
“Viajar é útil, exercita a imaginação. […] Aliás, à primeira vista, todos podem fazer o mesmo. Basta fechar os olhos. É do outro lado da vida,” afirma o trecho do escritor maldito Louis-Ferdinand Céline, que abre o filme e utilizo aqui para encerrar este artigo. Viver é mais do que ser apenas correto. Valorizar a beleza estética e a fortuna. Tem outro lado, talvez de mais sombras, de monstros que, se enfrentados, podem virar bichinhos de estimação. A verdadeira beleza está em sermos os mais parecidos possíveis, com nós mesmos.