Começo de ano, preguiça de alguns felizardos em férias, sensação de ressaca para outros, dois meses que se arrastam até o país engrenar. Leio com frequência a estranheza dos estrangeiros diante desta espécie de ócio consentido anual, sempre entre janeiro e março. E sejamos honestos: já em parte de dezembro, a partir das vésperas do Natal, nota-se uma certa desaceleração geral.
Um país tão carente de educação e trabalho se dá o direito, por convenção histórica, de ficar quase três meses “à sombra”, esperando a chegada de março para, aí sim, entrar de verdade na busca de soluções para tantos problemas. Estima-se em mais de 13 milhões o contingente de desempregados no território nacional. É uma chaga social que transcende a simples falta de ocupação, da ausência de renda, da baixa autoestima que fere a dignidade humana.
É uma legião de brasileiros que dependem visceralmente do poder público. Saúde, educação, segurança, assistência à família. Tudo isso é inacessível para milhões de brasileiros, mas até março tudo se resume à espera, expectativa e esperança de que, em outubro, emerja um salvador da pátria das urnas para resolver todas as nossas mazelas.
Roupa formal, compromissos, horário, obrigações? Somente em março…
O direito ao descanso é sagrado a todos que trabalham duro ao longo do ano. É inadmissível, todavia, constatar que muitas estruturas públicas funcionam “à meia boca” no auge do verão. Mantêm expediente reduzido e quadro de pessoal diminutos, agravando as agruras de quem busca alternativas ao desemprego que machuca.
Seria devaneio esperar que hábitos tão arraigados como a desaceleração do Brasil no verão sejam revertidos. A opção pelas férias no começo do ano é um dogma da cultura verde-amarela que, somada à proliferação de feriados e pontos facultativos de 2018 vai reduzir, em muito, os dias úteis.
Precisa-se de trabalho. Não somente para os que dormem nas filas de emprego, mas necessitamos de produção de bens, de serviços, de inteligência para sair do atoleiro que a crise política, ética e econômica impôs a nós. Mas ao contrário da busca de mudanças, nota-se um feérico esforço para manter as coisas como estão.
Quem encontra-se em situação estável não tem motivos para mudar. Há aqueles que veem o mundo passar diante dos olhos sem forças para fazer a diferença. Está cansado com o festival de barbaridades que desfila no noticiário de tevê. Urge encontrar um meio termo para que todos tenham acesso à vida digna onde o trabalho é apenas um dos preceitos, o ponto de partida.
Recém estamos no limiar de janeiro. Ainda há muitos congestionamentos, filas e irritação rumo ao litoral, estação rodoviária, nas rodovias e aeroportos. Roupa formal, compromissos, horário, obrigações? Somente em março. Até lá o Brasil hiberna.

