Assello Frehlich, ainda é reconhecido por antigos clientes e amigos em diversos logradouros do município. Fato curioso é que muitos dizem manter em boas condições de uso, utensílios, como fogões, adquiridos no seu antigo estabelecimento, o Armazém de Secos & Molhados na década de 1950, que posteriormente virou a Comercial Frehlich. Com carinho muitos clientes fazem questão de conversar com o carismático comerciante aposentado. No último dia 15 de maio, ele completou 90 anos e reuniu toda família para comemorar. No dia a dia, gosta de andar pelas ruas do Centro, às vezes acompanhado da esposa para fazer compras, almoçar fora ou simplesmente passear, sempre alegre, disposto e afetuoso com os amigos que encontra.
Natural de uma família de agricultores estabelecida na divisa entre Bela Vista e Rui Barbosa, em Arroio do Meio, é o terceiro filho entre oito irmãos. O único que teve o sobrenome registrado sem o trema na letra “ö”, sendo abreviado para o fonema “e”. Em busca de novos rumos, aos 17 anos de idade, buscou trabalho na capital do RS, onde atuou como balconista no Baratilho Porto Alegre, situado na Benjamin Constant, 798. O proprietário era um árabe de religião mulçumana.
Assello era o único dos seis funcionários que residia com a família, os demais moravam num alojamento. O fato de frequentar a Catedral era bem visto por seu empregador, que sempre o liberava para folgas nos feriados religiosos. “Era uma família que rezava três vezes ao dia com a cabeça inclinada para o sol nascente, em respeito a Maomé”, recorda.
Aos 19 anos, numa das festas da Paróquia, conheceu sua futura esposa Iria, da família Diehl de Costão, Estrela, com quem mais tarde teve sete filhos (um falecido), 16 netos e seis bisnetos. A intenção de Assello era casar-se e levar Iria para Porto Alegre. “Até recebi uma boa proposta para continuar, mas ela não gostou da Capital”, revela.
O casamento ocorreu quanto ele tinha 21 anos de idade e ela 19. Paralelamente, nessa época, em 1950, Assello alugou a Casa de Comércio da Família Moesch, no Centro de Arroio do Meio, onde hoje está situada a Farmácia 24 Horas do ex-prefeito Sidnei Eckert. O fato de ser bem relacionado com as famílias de Bela Vista e Rui Barbosa, parentes, e muitas outras pessoas do município, fez o negócio prosperar. Junto com o armazém, funcionava um bar. Além de dispor de alimentos a granel, compra e venda de ovos, galinhas, banha e suínos, carnes e embutidos de açougues, realizava agenciamentos para o frigorífico Ardomé, o que potencializava o leque de atuação. Um dos destaques era a revenda de itens em Caxias do Sul – uma carga por semana –, região onde a maioria dos agricultores produzia uvas e hortifrutigranjeiros e demandava de produtos de origem animal. Neste período a ajuda de seu irmão, Lauro Fröhlich, foi importante.
Se eu tivesse de recomeçar, seria comerciante outra vez
Em 1954, Assello adquiriu o imóvel próprio, na quadra ao lado, ainda na Dr. João Carlos Machado, local onde hoje reside. Parte da área é ocupada por outros pontos comerciais que lhe rendem aluguéis. Entre os principais concorrentes da época figuravam: Oscar Barden, Oli Friedrich e Fleck e Cia, e vários outros.
Aos poucos, o estabelecimento de Frehlich passou por adequações, acompanhando as transformações na cultura de consumo e negócios. O velho balcão, onde proprietários atendiam os clientes, deu lugar à prateleiras, onde os consumidores podiam escolher suas mercadorias e se direcionar a um caixa. O bar também foi fechado, pois não combinava com o espaço frequentado por famílias. Isso levou Assello a frequentar bares que até então eram concorrentes, para conversar com seus fornecedores de alimentos de origem animal, aumentando ainda mais o leque de amizades e negócios.
Sua esposa e todos os seus filhos atuaram em seu estabelecimento. “Certamente todos aprenderam alguma coisa comigo, mas eu tive a oportunidade de aprender muito com eles, especialmente em torno das novidades, conceitos e parâmetros”, dimensiona.
Socialmente, Assello e sua família frequentavam, principalmente, as programações da igreja Católica, a casa de seus pais, de seus sogros, de seus irmãos e cunhados e, recebiam suas visitas. Pensando na integração social de seus filhos, chegou a associar-se no Clube Esportivo, mas seu local preferido, embora frequentado eventualmente, era a antiga Aliança Católica. Aposentou-se após 37 anos de contribuição, mas manteve seu comércio aberto até 1990. Seus filhos seguiram outros rumos e ele decidiu adaptar o imóvel em salas comerciais, para ter uma renda paralela à aposentadoria. Como forma de ocupar-se e continuar envolvido na sociedade, partiu para o voluntariado, integrando o Conselho Deliberativo do Hospital São José, presidiu a Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro e o Conselho Comunitário da Execução Penal, onde segue como presidente de honra, por ser um dos líderes da iniciativa pioneira na ressocialização de detentos, e foi correspondente do periódico Skt. Paulus Blatt.
Destaca o fato de ter construído amizades com pessoas de outras religiões como pastores de igrejas luteranas e quadrangulares. “Respeito a todos que creem em Deus e procuram seguir a prática da boa fé”. E se orgulha, principalmente, pela família que construiu com sua esposa, e com a certeza de que se tivesse de recomeçar, seria comerciante outra vez.