São cerca de 40 semanas, de espera, mudanças e preparação. Assim que chega o momento do parto, nascem, um bebê, com um mundo de descobertas pela frente e, junto dele, uma mãe, cujas sensações e novidades terão as mesmas proporções. A psicóloga e jornalista, Tamara Bischoff, de Arroio do Meio, traz à tona, com seu relato, a doçura e a emoção de ser mãe pela primeira vez, juntamente com uma visão profissional desta fase tão importante na vida da mulher. Ela e o marido, Moisés Ely, estão juntos há 17 anos e, há um ano e três meses, chegou a pequena Lívia Bischoff Ely.
Quando veio o resultado positivo para a gravidez, Tamara lembra de ter tido uma mistura de sentimentos, como emoção, alegria e medo. “Como eu já havia engravidado duas vezes alguns anos antes, e tido duas perdas, tive receio de que isso pudesse ocorrer novamente, até porque optei por não investigar as causas dos abortos. Então, nesta gravidez, resolvi fazer as coisas diferentes, seguir mais meus instintos, e deu certo”, relata.
Os momentos mais marcantes foram no nascimento, ao ouvir o primeiro choro de Lívia e receber a bebê em seus braços. A hora da alta hospitalar teve um significado tão forte, que Tamara não conteve as lágrimas. “Naquele momento, finalizava um ciclo, e minha emoção era enorme. Quando coloquei a roupa para ir embora, comecei a chorar. Minha família não entendeu logo o que estava acontecendo, e eu só dizia que estava feliz. E assim foi por alguns dias. Chegar em casa, colocar ela no berço preparado com tanto amor, amamentar. Os primeiros dias foram pura emoção”, recorda.
A psicóloga admite que os meses iniciais foram complicados, mas a segurança no cuidado da filha veio de forma natural. “Costumo dizer que no início, achava que todo mundo sabia cuidar da minha filha melhor do que eu. Hoje, acho que sei melhor que todo mundo”, compara.
Mãe e filha: crescimento simultâneo
Quando perguntada sobre o que mudou após o nascimento de Lívia, Tamara responde de forma bem-humorada: “Seria mais fácil eu dizer o que não mudou na minha rotina (risos). Acho que a única coisa que não mudou é que continuo tomando banho e escovando os dentes todos os dias, ainda que mais rápido do que antes. Brincadeiras à parte, um filho altera muito nosso cotidiano”.
O tempo extra que antes era dividido entre cuidados pessoais, da casa, estar com amigos, com o marido, ler, assistir TV, ir para a academia, hoje, é dedicado para Lívia. Ela passeia com a filha pelo bairro onde moram pela manhã e no fim da tarde, a alimenta, coloca para dormir, brinca, cuida das roupas, fraldas e dá banho. “Claro que tenho a parceria do meu marido em grande parte dessas atividades, mas como ele trabalha bastante, acabo ficando com a maioria delas”, acrescenta.
Com a maternidade, Tamara se viu mais corajosa, forte, madura, paciente e ainda mais atenta e sensível ao ser humano, especialmente à infância. “Minha paciência também tem se ampliado e ajuda muito saber um pouco sobre desenvolvimento infantil, colocar-se no lugar do bebê, compreender suas demandas. Quanto ele joga um objeto no chão diversas vezes, não quer dizer que está sendo malcriado, te testando, ele apenas está achando aquilo incrível e quer ver se toda vez que jogar no chão vai acontecer a mesma coisa. Além disso, entendo que essa experiência também me torna melhor psicóloga”, conclui.
Pontos positivos e negativos
O amor é a primeira palavra que a psicóloga cita, sobre o melhor de tornar-se mãe. A experiência é completamente envolta em um ciclo de criar, cuidar e ver os resultados conforme a criança cresce. As descobertas de Lívia não são só dela, são de toda a família, que não consegue conter a alegria e vibra com isso. “Por isso que no início acho que é tão difícil. É uma doação extrema por parte da mãe, e o retorno recebido é quase nulo. O bebezinho nos suga, não nos deixa dormir, chora, quer colo. Não sabemos bem o que fazer, ouvimos conselhos e, às vezes, ficamos perdidas. Então, quando ele começa a sorrir para nós, nos reconhecer, chamar mamãe, estender os braços em busca dos nossos, acho que essa é nossa maior recompensa”, desabafa.
Os momentos difíceis existem. Tamara cita como exemplos, o cansaço e a falta de liberdade. Mas ressalta que é preciso saber lidar com isso e a ajuda de familiares auxilia muito neste sentido.
Às vésperas do Dia das Mães, ela pensa em todas as mulheres que procuram fazer o seu melhor no exercício deste papel tão especial, cada uma a seu modo. “As que estão exercendo a maternidade, as que perderam seus filhos, que sonham em tê-los, que estão cansadas com todas as demandas da vida, que estão realizadas, que têm sentimentos ambíguos sobre ser mãe. Todas têm minha admiração”, diz, lembrando, em especial, da mãe, Maria Helene, da avó, Ana Imelda e de sua irmã.
A maternidade na visão da psicologia
Como psicóloga, Tamara analisa algumas questões referentes à maternidade, abordando aspectos como as mudanças, as dúvidas que podem surgir e o papel da família. Confira a entrevista:
AT- A gestação marca uma série de mudanças no corpo e na vida da mulher. No ponto de vista psicológico, o que isso representa para ela?
TB– Bem, pode representar muitas coisas porque a gravidez é um evento singular e marcante na vida da mulher, provocando alterações físicas e psicológicas. Essas alterações podem desencadear medo, dúvidas, inseguranças e expectativas, uma ambivalência de sentimentos. Se pensarmos nas alterações que são marcadas no corpo, é preciso considerar que, numa época em que o corpo tem imperioso valor como padrão de beleza e aceitação social, para a mulher, a gestação também significa a renúncia de pertencimento a esse ideal de perfeição. Nesse mesmo tempo, ela passa a perceber-se com um corpo que abriga, que acolhe em si outra vida e que, pouco a pouco, vai se transformando num corpo de mãe. A forma como cada mulher vai lidar com essas mudanças é muito singular e vai depender, em boa parte, da sua maturidade para tornar-se mãe e de sua história como filha. A gestação também é um reencontro da mulher com a própria mãe, onde a importância do vínculo entre mãe e filha se torna ainda mais evidente, especialmente porque, ao tornar-se mãe, a mulher também vai se aproximar das representações psíquicas de maternidade que ela construiu na infância.
AT- É possível sentir medo, ansiedade ou insegurança? Como lidar com isso?
TB- Para cada mulher, a maternidade é vivenciada de uma maneira muito particular. E, em muitos casos, sentimentos como esses podem aparecer em alguns períodos da gestação, inclusive alternando a intensidade. Isso porque a mulher está diante de algo novo e que mexe com questões muito profundas. Gerar uma vida, ainda que possa ser muito normal sob o ponto de vista biológico, não tem nada de trivial para o nosso psiquismo. Sem falar que, quando uma mulher anuncia que está grávida, passa a ser vista de uma forma diferente, em muitos casos, como uma criatura que precisa ser cuidada, não porque ela está passando por uma série de mudanças, mas porque está gerando outra vida. É delicado lidar com o fato de que seu corpo passa a ser quase que uma propriedade social. Hoje, somos inundados com informações a respeito de tudo, e com a gestação não é diferente. Entendo que é muito importante buscar alguns conhecimentos a respeito, mas procurar fazer isso com equilíbrio, ou seja, acreditar também em si mesma como gestante, como mãe, escutar as pessoas do seu entorno, e não tentar ser a mais perfeita.Aceitar suas falhas, seus medos, suas atrapalhações. E rir disso. É claro que estou me referindo a casos nos quais não há prejuízo das atividades cotidianas, em que o medo, a insegurança ou a ansiedade estejam presentes juntamente com a alegria, o prazer, a expectativa, as boas apostas. Caso os sentimentos de angústia ou medo paralisem, é hora de buscar uma ajuda profissional. Os psicólogos podem auxiliar nesse aspecto.
AT- A mídia (filmes, séries, novelas) mostram um recorte de maternidade que, muitas mães dizem ser diferente. Poderia falar um pouco a respeito disso?
TB- Em geral, o que se vê na mídia e nas redes sociais é uma maternidade mais romantizada, ainda que hoje já se tenha acesso a depoimentos mais reais a respeito do assunto. No entanto, o que é ofertado para o consumo da massa continua sendo a ideia da mãe como a responsável por cuidar dos filhos, o pai como aquele que “ajuda” a mulher, e como se a maternidade fosse apenas alegria, prazer. E sabemos que não é assim. Ela traz consigo muito sofrimento também, de diversas ordens. Cada mulher, dada a sua história, viverá a gestação, o parto, o cuidar, de maneira única. Um exemplo é que umas sentem imenso prazer em amamentar, outras não. Algumas abrem mão da carreira profissional para se dedicar aos filhos, outras não veem a hora de terminar a licença-maternidade para voltar a trabalhar fora. E não nos cabe, como sociedade, apontar ou julgar. Cada mãe, pai, família, deve procurar o que é melhor para si e para os seus filhos.
AT- Qual o papel da família, como um todo? É importante ter um suporte?
TB– A família é a base para a formação de um ser humano. É nas primeiras relações que a criança aprenderá as coisas mais significativas. É imprescindível ter o suporte familiar, ou então de amigos, pessoas próximas. Ter com quem contar em momentos como esses, da gestação, do nascimento e dos primeiros meses alivia muito os possíveis sofrimentos de mães e pais. É sempre bom ter com quem compartilhar a vida, seja para comemorar ou para lamentar. Para a mulher, toda essa vivência vem carregada de muitas mudanças, e é comum que se sinta, por vezes, sozinha demais. Então, sempre que possível, devemos oferecer apoio.