Desde março a Promotoria de Justiça da Comarca de Arroio do Meio tem como titular a promotora Carla Pereira Rêgo Flôres Soares. Com 20 anos de Ministério Público (MP), ela já atuou em Capão da Canoa, Encruzilhada do Sul, Tapes, Feliz e, por último, Nova Petrópolis. É natural de Porto Alegre e optou por Arroio do Meio por questões familiares – o marido é da região e tem negócios em Estrela – e por conhecer as características da Promotoria e da comarca. Como foi colega de turma do seu antecessor, o promotor Paulo Estevam Araújo, tinha boas referências da cidade.
As indicativas de Araújo se confirmaram ao chegar no município. A promotora diz que encontrou a Promotoria organizada, sem grandes demandas em atraso, apesar dos oito meses que ficou com o promotor substituto André Prediger atendendo de forma parcial. Afirma que pretende ficar muito tempo em Arroio do Meio e tem uma linha de atuação parecida com a do promotor Paulo Estevam. Gosta de ajudar a comunidade, de dialogar e resolver as questões de forma amigável, mas sabe que haverá situações em que serão necessárias medidas não tão simpáticas para alguns. Faz parte do ofício.
A promotora Carla percebe que Arroio do Meio e Nova Petrópolis são cidades com características semelhantes: são organizadas e possuem uma boa estrutura econômica e social. Pontua que comunidades empobrecidas tendem a ter crimes mais violentos e que, no caso de Arroio do Meio, o trabalho conjunto entre Brigada Militar, Polícia Civil, Promotoria e Judiciário, contribui para inibir a ação de criminosos. “O Dr. Paulo já tinha dito que era bom de trabalhar em Arroio do Meio, que a comunidade era boa”, observa.
Acerca das demandas da Promotoria, declara que há algumas questões de meio ambiente e de improbidade, mas nada fora do normal. “É uma Comarca que é bem organizada. Teve um promotor titular por um período longo e tem um juiz titular atuante. A Promotoria é organizada. Não tive dificuldade nenhuma, corresponde ao que o Dr. Paulo tinha passado”.
Uma das frentes que deve ter uma atenção especial por parte da promotora é a infância e juventude. Deseja fazer um trabalho parecido com o realizado em Tapes e Encruzilhada do Sul, onde havia casas de passagem. Já visitou o Abrigo de Menores e considera importante a atenção do Ministério Público no atendimento às crianças abrigadas, no sentido de diminuir ao mínimo possível o tempo de permanência e dar o máximo de apoio e conforto. Pretende fazer reuniões periódicas com a rede para tratar dos processos das crianças abrigadas e ressalta que são casos prioritários.
No tocante ao Presídio Estadual de Arroio do Meio, elogia a participação do Conselho da Comunidade que, juntamente com a Susepe, transforma a casa prisional num modelo a ser seguido. “O exemplo de Arroio do Meio deveria ser usado para convencer outras comunidades a aceitarem ter presídios. Não superpresídios, mas presídios pequenos, nos quais realmente possa ser feito um trabalho de ressocialização, e o cumprimento da pena seja feito com dignidade. É certo que uma pessoa que praticou um crime tem de cumprir uma pena. Mas a pessoa tem de ter dignidade”, pontua, destacando que a comunidade precisa ser parceira no processo de ressocialização. “As pessoas deveriam entender que é muito melhor conseguir dar um bom tratamento e tentar ressocializar o criminoso, que vai voltar para a comunidade, do que mandar ele para longe e, às vezes, ele vir com ‘novidades’ ou cometendo crimes mais graves”, avalia.
O trabalho do MP
Em relação ao trabalho que o Ministério Público faz, a promotora acredita que a população ainda não o conhece, de todo. Mas vê evolução. Se antigamente o promotor era visto apenas sob o aspecto criminal, no júri, hoje o trabalho se dá de forma ampla. A partir de 1988, com a Constituição, o Ministério Público se firmou em outras frentes, como meio ambiente, improbidade administrativa e no direito do consumidor. Para ela, a figura do promotor criminal continua importante e aponta a atuação conservadora e rígida do promotor Paulo Estevam Araújo e do juiz João Regert como determinantes para que Arroio do Meio, e a comarca como um todo, tenham poucos casos de crimes graves.
O Ministério Público e a Lava Jato
O trabalho do Ministério Público no combate aos crimes de corrupção teve mais visibilidade a partir da operação Lava Jato. No entanto, muito antes, o Rio Grande do Sul já registrava casos de políticos presos a partir da ação do Ministério Público, como o ex-prefeito de Tramandaí e Cidreira, Elói Sessim, preso na década de 1990.
Para a promotora Carla, o fato de que a população está vendo o Ministério Público como um agente ativo no combate à corrupção é positivo. Pondera que a exposição midiática, às vezes, é excessiva e exagerada. “Eu, enquanto promotora, tenho um comportamento mais discreto. Acho que o Ministério Público tem de divulgar o seu trabalho, mas não gosto de superexposição. Penso que fazendo nosso trabalho ele aparece por si só”.
Questionada acerca dos vazamentos das conversas entre o então juiz Sérgio Moro e o procurador do Ministério Público Federal, Deltan Dallagnol, a titular da Promotoria de Arroio do Meio diz que sabe o que leu em reportagens, mas não tem como precisar se as mensagens correspondem à realidade dos fatos. “Se as mensagens correspondem à realidade, o agir dos envolvidos não foi correto, porque o juiz tem de manter a imparcialidade. Agora, não sei se tudo aquilo que foi divulgado, ou que eu li, corresponde à realidade. Então fica complicado opinar”, afirma, salientando que juiz e promotor fazem parte de uma comunidade e têm o direito de ter suas opiniões. “Quando a gente faz um concurso e assume um cargo, que é parte de um poder, que é o Poder Judiciário ou no Ministério Público, tem certas atitudes que nós temos de ser mais discretos. Tem o ônus e o bônus. Juiz e promotor têm de ter uma vida mais discreta, participar da comunidade com discrição. Tem de guardar um certo respeito ao cargo. E não falo apenas da Lava Jato, falo no geral. Temos de nos resguardar”.
Para a promotora, em todas as camadas sociais, profissões e instituições existem pessoas que não obedecem às regras. No Rio Grande do Sul, ressalta que a Corregedoria é rigorosa e já afastou ou exonerou promotores e juízes que estavam agindo em desacordo com o cargo. Pontua que, por mais que a ação delituosa de um colega de trabalho manche a instituição, o trabalho bem feito do Ministério Público e a parte positiva se sobressaem.