O mundo mudou muito nos últimos anos. Aquele chão que pisamos na infância praticamente sumiu. Quer ver?
A gente tinha muita fé no Brasil. Levava para o lado do sério a frase de Olavo Bilac: “Criança, não verás país nenhum como este!” O futuro de glórias estava à espera. Futuro do tamanho continental do território que ia do Oiapoque ao Chuí. Enquanto isso, o dia a dia se arrastava sem sobressaltos, fora as enchentes e os pecadilhos que o padre perdoava na igreja. Ninguém vigiava o preço do dólar. Ninguém precisava dar um like para as resenhas dos outros.
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Noite do alto verão eram feitas para curtir na frente de casa, pegar uma fresca e cavaquear com vizinhos. Hoje o pessoal mergulha em YouTube e sufoca fora do ar refrigerado. Sem falar que tem medo de assalto e mal conhece os vizinhos.
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Quem ainda se entrega à doçura do mate? Mate com direito a canela e folhinhas cheirosas por cima da erva? Mate acompanhado de rapaduras de leite, pipoca em melado ou calça-virada… O pavor dos quilos a mais não contava entre as amarguras antigas.
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Quem ainda vai no instituto? Hoje em dia se vai no salão e sempre com hora marcada, para chegar e sair o mais ligeiro que der. Nas antigas, ir no instituto era um programa para toda uma tarde. Era chegar lá, sentar, contar quantas mulheres estavam na fila e, docemente, esperar. Aliás, o melhor de tudo era exatamente esperar. Passar toda uma tarde em paz, sem nada mais que esperar, só aguardando a vez de ficar mais bonita. Enquanto isso, cabia encetar a diligente tarefa de “aggiornamento”. Ou seja, num admirável esforço de equipe, todas as presentes contribuíam – na medida dos próprios talentos – para informar sobre as ocorrências na aldeia, bem como para juntar os palpites, imaginar aventuras, cogitar soluções…
Enfim, desfiava-se um exaustivo trabalho do espírito, a par dos cuidados com a própria beleza. E quase sempre era possível deixar o instituto com uma boa sensacão. Afinal, as desgraças piores batiam na casa dos outros, principalmente por que eles não sabiam fazer boas escolhas. Sim, porque a conclusão mais frequente de toda a conversa era: “Ah, se fosse comigo… Ah, se fosse eu…”
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Bons tempos, bons tempos…