Ivete Kist
Digamos que você tenha um problema muito complicado para resolver. Você não sabe o que fazer. Chega alguém e lhe oferece a solução. Trata-se de uma solução simples e definitiva.
Se isto acontecer, você pode ter certeza de uma coisa. A ideia que lhe dão terá uma característica a mais. Além de ser simples e definitiva, a solução será forçosamente também errada.
– Por quê?
Simplesmente por que os problemas complicados têm soluções igualmente complicadas.
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Gente que não cozinha na primeira fervura – como eu -, quando ouve uma proposta de solução fulminante, fica logo de orelha em pé. Se não fossem outras as razões, lembraríamos da lição deixada pelo Presidente Fernando Collor. Quem viveu aquela época sabe. Fernando Collor ia arrumar a economia nacional com um tiro só? Pois é. O que conseguiu foi esculhambar tudo mais ainda.
Quando a solução de um problema depende de iniciativas de um governo, a gente sabe que há obstáculos adicionais. Dificilmente um governo está disposto a pagar o preço que as soluções mais necessárias cobram. As soluções mais necessárias pedem intervenção profunda e demorada, do tipo que ultrapassa um período de mandato. Pedem alteração da estrutura a que estamos acostumados e, não raro, demandam muito dinheiro. Além disso tudo, elas mexem com gente graúda. Como se sabe, os graúdos tiram o chapéu uns para os outros. Dificilmente arrancam as penas uns dos outros.
Estou falando isso, ao pensar em dois problemas complicados: educação e segurança pública.
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Repetindo: problemas muito complexos precisam de abordagem múltipla. Em geral, não se sabe por onde começar a puxar o fio que desfaz o emaranhado. Seja como for, o ideal é mexer na ponta que produz impacto mais imediato. Assim, os resultados que começam a aparecer vão animar o seguimento da tarefa.
No caso da educação, penso, que fazer investimento amplo na qualificação/valorização de professores é o que impacta mais.
No caso da segurança pública e, em particular, do consumo de drogas o ponto mais crucial o que afeta o consumo. Sem consumo não haveria venda. Nem preciso dizer que é assim que o comércio funciona. O cara que vendia máquinas fotográficas sabe disso. É a clientela que alimenta o comércio.
Temos focado muito no combate à oferta de drogas. Possivelmente, parece mais viável caçar o vendedor, em vez de atuar na esfera do consumo. Só que o resultado é este que conhecemos. Os vendedores de produtos de alta demanda não cessam de aparecer.
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Ou será que, no fim das contas, a razão está com uma personagem de Graciliano Ramos que diz assim: “Tudo neste mundo é canoa furada”?