Acordei com um aperto no peito às quatro horas da madrugada fria naquele 1º de junho de 2009. Eu me sentia distante, como se estivesse envolvido em uma longa caminhada no nevoeiro. Voltei a dormir. Sonhei que atravessava um corredor imenso, todo branco, com dezenas de pessoas sentadas na espera de algo que eu não sabia bem o que era. Vestidas em trajes de passeio, rostos sérios, perdidos. Uma delas veio ao meu encontro, apenas me observou. Tinha uma interrogação no olhar. Tentou falar, mas as palavras pareciam engolidas pelo vácuo.
Havia uma porta, ainda fechada. Tentei abrir, mas parecia chaveada e o entorno carregado de muita luz, atrapalhava a visão. Eu me aproximava deles, que me observavam em um silêncio desconcertante. Tenso e angustiado queria ajudar, mas como? De repente, o som irritante de uma canção aguda me despertou. Seis horas, alertava o rádio relógio.
Mal abri os olhos e o noticiário matinal citou o sumiço do voo AF 447 em um Airbus A330 da Air France que fazia o trajeto Rio-Paris. Desapareceu na imensidão do Oceano Atlântico com 228 pessoas a bordo, 53 brasileiros.
Na ocasião não quis mistificar ou relacionar a tragédia a meu estranho sonho, mas rezei para aqueles olhos aflitos e questionadores que não saíam de minha cabeça.
Agora, passados quase 14 anos, a justiça francesa absolveu, em maio deste ano, a fabricante europeia Airbus e a companhia aérea Air France da acusação de homicídio culposo (quando não há intenção de matar) por aquele acidente na rota Rio-Paris. “Foi um evento imprevisível, sem responsabilidade de crime”, decidiram.
E mais uma vez, fiz uma oração por todos aqueles, passageiros e tripulantes, para que tenham conseguido abrir aquela porta de luz e, assim, seguido em sua viagem, no plano em que Deus lhes designou. “Tentamos de tudo”, repetiram os pilotos à caixa preta, posteriormente localizada.
Quem sabe, de alguma forma, estive por lá, na imensidão atlântica, acompanhando a passagem daquelas pessoas, ainda confusas. Não sou um sujeito místico, pouco entendo desses temas, mas ainda hoje, me arrepia a lembrança que compartilho agora.