Em volta de uma mesa de bar, qualquer tema é pauta. Polêmicas são bem-vindas desde que respeitem as opiniões por mais doidas que possam aparentar. As pesadas crises internacionais, os comentários à direita, ou esquerda, ficam obrigatoriamente no centro apaziguador, de preferência regados a brindes de bom humor. Em um bar não se resolve o mundo e, assim, nenhuma discussão deve poluir o ambiente, invadir outras mesas em irritante poluição sonora.
Vamos combinar desaforos apenas aqueles autorizados pelo grupo. “Vai tomar lá (…)”, ou elogios às santas mamães. É claro, sempre pode aparecer aquele chato que ama criar desconforto na órbita das mesas ao redor. Sim, lá todos carregam seus próprios temas. Guerras, paixões, times e partidos.
As pautas são boas e, bem conduzidas, quem sabe não resultem em literatura, como decidiu um grupo de amigos, ex-colegas de redação. Incentivados pelo jornalista e escritor Flávio Dutra, já estão em segunda edição do “Entre um gole e outro”, livro de crônicas típicas de boteco, no caso o Bar do Alexandre, no Menino Deus, em Porto Alegre.
Mas de volta ao lugar comum, em um desses sábados de chuva fria, vento e ameaças de ciclones, um amigo músico da noite, se viu obrigado a enfrentar um sujeito que insistia em determinadas canções. Todas opostas ao estilo do bar. “Preconceito!” Esbravejava o cliente que exigia hits de música sertaneja onde o repertório era tipicamente oposto. “Elitismo barato!”, repetia exaustivamente. Batia água lá fora e as pessoas se impacientavam com o chato.
Lá pelas tantas o músico, já saturado, soltou seu violão e correu à cozinha. Até o dono do bar assustou-se com a cena. Alguns minutos depois, retornava carregando um copo com um líquido branco em uma bandeja. Cochichou algo com o garçom que, instantes depois, oferecia ao chato um copo de leite “on the rocks”, ou seja, com duas pedras de gelo. “Se eu quisesse isso iria a uma lanchonete”, recusou o bebum.
De volta a seu banquinho, o cantor emendou ao microfone, afinadamente, sem aumentar o tom: “Então, quando o senhor desejar outro tipo de música, eu mesmo lhe indico espaços adequados”. Mal concluiu a frase e foi aplaudido com entusiasmo pelo público que acompanhava a implicância do chato. Este resmungou mas acabou rindo do próprio ridículo. Antes de ir embora, abraçou o cantor.
Quando as portas do bar fecharam, os problemas do mundo pareciam distantes. Prontos para uma solução definitiva. A exceção da chuva, é claro e as muitas vítimas de cheias que se repetiram nos dias seguintes. Mas o que eu guardei de lição nesse caso, foi o jeito bem humorado do músico de resolver a parada. Sem gritos ou murros, se valendo apenas de uma afinada dose de sarcasmo e paciência. Mas, por via das dúvidas, decidiu ensaiar alguns clássicos sertanejos.
_“E nessa loucura, vou vou negando as aparências, disfarçando as evidências, mas pra que viver fingindo…_ Tudo em nome da paz e tolerância no boteco.