Na próxima segunda-feira, 20 de novembro, comemora-se o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra. Bem que a data merecia ser um feriado. Há 485 anos, começavam a chegar no Brasil os carregamentos de pessoas escravizadas. Em sucessivas viagens, navios desembarcaram no território nacional quase 5 milhões de africanos. Ou seja, aqui chegou praticamente a metade de todos os negros trazidos para os portos das três Américas, enquanto o tráfico negreiro cruzou o Oceano Atlântico.
Na infância, eu costumava ouvir expressões de desvalor em relação aos negros e aquilo parecia normal. Tenho até vergonha de contar isso, mas faço, para mostrar como a gente pode adotar preconceitos quase sem notar. Não vou repetir aqui essas expressões nem as frequentes piadas, porque tenho quase certeza de que você também conhece histórias desse naipe.
Só quero dizer que preconceito é isso mesmo. É uma crença que a gente adota sem ter base real e sem pensar a respeito.
Embora sempre ouvíssemos que o Brasil era uma democracia racial, o tempo nos ajudou a descobrir que não é bem assim. Somos um país preconceituoso e racista. Temos uma desigualdade de classes que nos torna um campeão mundial. Só seis países no mundo estão na nossa frente em termos de desigualdade. Entre nós, a riqueza aumenta e a pobreza cresce. Cerca de 3% da população detém 60% da riqueza. E todos sabemos que os negros predominam amplamente na camada mais pobre, menos educada e mais desassistida. Não por acaso.
Quando a escravidão foi abolida no Brasil, não houve qualquer movimento no sentido de apoiar aqueles que deixavam as senzalas da noite para o dia. Não se pensou sequer em programas de habitação, por exemplo. O fato é que desde o começo os negros não foram tratados como cidadãos. Até hoje, pessoas de descendência africana habitam as periferias insalubres e perigosas, enquanto os bairros nobres, com boa qualidade de vida, segurança e serviços públicos de boa qualidade são redutos dos brancos. Como na época da escravidão, pessoas negras ocupam os postos de trabalho mais precários. Estatisticamente, pobreza no Brasil permanece como sinônimo de negritude.
Ou seja, dá para entender o dia da Consciência Negra como alerta para as tarefas gigantescas que estão à espera. Primeiro, é preciso reconhecer com mais clareza toda a contribuição dos milhões de homens, mulheres e crianças que foram comprados na Africa para vir trabalhar no Brasil e ser uma peça útil na propriedade dos seus donos. Falta inventariar a contribuição para o desenvolvimento econômico, a contribuição no campo da música, dos esportes, da culinária, da religiosidade, etc.
Cabe criar museus para expor e para preservar a cultura africana, a exemplo dos museus que já existem para celebrar a presença de outras etnias. Mas, de longe, a tarefa principal é encontrar formas de vencer o racismo e a desigualdade. O dia da Consciência Negra não precisa continuar sendo o dia da paciência negra.