As frequentes andanças tem me levado a dizer que o diminuto território de Portugal abriga uma diversidade admirável. Há pontos de interesse aonde quer que se vá. A arquitetura é bonita e os prazeres da mesa, um capítulo à parte. Que ninguém atravesse o Atlântico com ilusão de dietas. Em Portugal, resistir é impossível. Os doces são uma deliciosa tortura de gemas, açúcar, castanhas… As carnes e os peixes, soberbos, em óleo e sabor.
Viajando na direção do nordeste, vai-se encontrar a região chamada Trás-os-Montes. A região de Trás-os-Montes ficou meio isolada por séculos, fosse em função do relevo, fosse por falta de estradas. Mas hoje a coisa mudou. De modo que a ligação com a Espanha de um lado e com Portugal, do outro lado, tem facilitado a vida de todos. Os turistas podem andar à vontade, assim como os vinhos, azeites e carnes de produção transmontana.
A melhoria das comunicações também revelou faces pouco exploradas. É o caso do idioma mirandês. O mirandês é uma língua que sobreviveu aos séculos. Em 1999, foi proclamada como a segunda língua oficial de Portugal. Hoje, as crianças aprendem a língua na escola e Universidades se mantêm estudando o assunto. Todavia o mais interessante de tudo é um projeto em andamento. O projeto que incentiva preservar velhas aldeias, exatamente do jeito que eram no passado longínquo.
Na aldeia preservada de Rio de Onor, no Trás-os-Montes, eu caminhava junto do arroio, cujas águas limpinhas era possível beber na concha da mão. Casas feitas de pedras escuras: estábulos na parte de baixo, a morada na parte de cima, tinham tramelas como suficiente fechadura das portas. Aqui e ali, os montes de feno esperavam o inverno. Hortas se estendiam junto das casas, sem que fosse possível saber a quem pertenciam. Um telheiro cobria uma fila de tanques, onde as mulheres lavavam as roupas entre conversas e risos. O único item em briga com a harmonia do conjunto eram as antenas de televisão nos telhados.
Um senhor de bengala descansava sentado no muro de pedras e eu achei que podia engatar um papo amistoso. Elogiei o conjunto tão belo. Ele escutou admirado. Aí perguntou:
– Mas o que tu achas bonito?
– O rio, as casas, as hortas… Enquanto respondo, me dou conta de que pode parecer falso o que digo. Eu venho de um outro lugar, exatamente do mundo que a TV despeja na casa do homem como se fosse o sétimo céu. Então, como vou explicar o impacto do silêncio da aldeia? Como dizer ali para o homem que uma vida cheia de coisas pode ser uma vida vazia? Ah! Eu não acho as palavras…
Quais palavras poderiam dar conta do assombro em face de portas que só necessitam de uma tramela de pau?