A história e trajetória de Jordan Fuentes, 35 anos, sua esposa Erika e o filho Aranza de 10 anos, que moram há sete meses em Arroio do Meio, é parecida com a de muitos imigrantes que saíram da sua terra natal em busca de melhores condições de vida, – depois que o regime chavista e atualmente de Nicolas Maduro, reeleito no ano passado para um terceiro mandato, em um pleito contestado pela oposição, – foi impondo dificuldades econômicas para grande parte da população. Deste enorme contingente de venezuelanos que deixaram para trás sua família, cultura e condições, nos últimos anos, principalmente a partir de 2015, nem todos conseguiram nesta longa caminhada uma situação de vida confortável. Questões que passam por adaptação a culturas diferentes, língua, saúde física para começar uma nova vida, emprego em uma área que pudesse pagar o necessário para firmar raízes e/ou ajudar familiares que ficaram longe, são algumas das dificuldades.
Jordan é natural da região de Guayana, que na sua extensão tem uma população com mais de 1 milhão de habitantes (entre as maiores da Venezuela), no estado de Bolivar. A região de divisas tem bastante mata e terreno montanhoso e faz fronteira terrestre com o Brasil pela cidade de Pacaraima (RR), por onde caminharam/ caminham a pé, centenas de imigrantes fugindo da falta de perspectivas no seu país.
Em conversa com a reportagem no AT, Jordan contou um pouco sobre sua vida e vinda ao Brasil, em 2020, em plena pandemia. Na época, as fronteiras estavam fechadas e um grupo de aproximadamente 20 pessoas iniciou uma caminhada que durou 4 dias. Uma das prioridades era procurar atendimento para uma senhora diagnosticada com câncer e que teve que ser conduzida de cadeira de rodas, pela fragilidade do seu estado de saúde. Mas segundo relato de Jordan, uns ajudavam os outros num espírito de solidariedade e sobrevivência diante do desconhecido. Na busca, chegaram até o Hospital das Clínicas em Boa Vista, capital de Roraima. Esta primeira missão de chegar até o hospital, apesar das dificuldades, burocracias, documentação, demora porque tudo estava fechado, teve êxito para atendimento emergencial, mas infelizmente, como o estágio do câncer desta querida amiga já estava muito avançado e por receber um atendimento tardio ela veio a óbito. Um grande baque. Estima-se que milhares de pessoas perderam sua vida durante a pandemia, não só por Covid-19, mas também por não terem recebido o atendimento dentro do tempo certo e adequado para doenças crônicas, por restrições impostas à população e falta de estrutura de atendimento, experiência em novos procedimentos, nos hospitais do mundo. Muitos tratamentos foram interrompidos. Neste período mais crítico da pandemia muitas pessoas que faleceram de Covid-19 nem enterro digno receberam.
PROCURA POR MELHORES SALÁRIOS
Jordan tem formação superior em Segurança Industrial, e na Venezuela trabalhava na PDVSA (empresa estatal que controla todas as atividades, relacionadas ao petróleo no país, incluindo exploração, produção refinação, comercialização…. e como o salário que era equivalente a cerca R$ 500 não atendia as expectativas, decidiu procurar algo melhor. Fundada em 1976, a PDVSA teve um papel fundamental na economia da Venezuela, que tem as maiores reservas de petróleo do mundo, segundo várias fontes, mas entrou em declínio por conta de corrupção, má gestão e sanções internacionais).
Jordan deixou para trás os pais e irmão que trabalha numa função na área do Ministério de Educação. A mãe não trabalha fora e com o rendimento do pai e do irmão a família consegue comprar o básico para viver, mas não sobra dinheiro para gastos extras como remédios, por isto Jordan pensa em trazê-los para cá nas férias de maio do ano que vem. Quando pode ajuda com algum valor, uma vez que, a situação econômica e política da Venezuela está cada vez mais crítica.
Depois da chegada e decisão de permanência no Brasil, com o trâmite de documentação, Jordan trabalhou inicialmente por cerca de quatro anos em Boa Vista, numa lancheria. “Sou muito grato ao dono que ajudou muito, inclusive com a documentação, intermediada pela OIM Brasil,” destaca o venezuelano. Diante da grande concorrência em várias atividades em Pacaraima, cidades próximas e mesmo na capital, por conta do trânsito de imigrantes não apenas venezuelanos, mas haitianos e outras nacionalidades, Jordan acabou vindo para o Sul.
VINDA PARA ARROIO DO MEIO
O primeiro trabalho em solo arroio-meense foi na Dália, mas, como não se adaptou muito à função, encontrou afinidade no trabalho de operador de caldeira na conhecida Hibisco, atualmente nas mãos da Circular Services of Work – Elis, na Barra do Forqueta. A empresa é especializada em lavagem industrial de uniformes de frigoríficos como é o caso da BRF, Minuano, Dália, JBS… Jordan diz que está muito feliz nesta atividade e a Elis, inclusive, ofereceu curso gratuito para que pudesse trabalhar na função. A sua esposa também trabalha na Lavanderia Industrial Elis e ambos conseguem ter uma renda muito melhor do que tinham na Venezuela. Para melhorar ainda mais os ganhos e graças a sua experiência na área gastronômica, aos domingos, Jordan trabalha no Restaurante Paroquial. Na reportagem ao AT fez questão de agradecer ao Beto e sua esposa Priscila, donos do restaurante pela oportunidade e apoio que recebeu. “Precisamos ser gratos e ter muita fé”. Jordan acredita que a força da fé opera verdadeiros milagres. Para ele, Deus já operou milagres em sua vida, como o ter livrado de ficar cego por conta de cataratas, graças a uma cirurgia feita em Boa Vista, que era de risco e poderia ter dado errado. Batizado católico, frequenta a Igreja Cristiana Assembleia de Deus na rua Rui Barbosa. Acredita que uma vivência cristã faz toda a diferença na vida de uma pessoa em relação à família, trabalho, costumes e tradição. Ele diz que gosta de Arroio do Meio, as pessoas são acolhedoras e aprecia muito a Praça Flores da Cunha, as apresentações culturais, artísticas e folclóricas, que teve oportunidade de assistir. Não pensa em voltar para a Venezuela, onde as dificuldades econômicas são muito grandes para a população e onde é preciso cuidar com o que se fala para não ser preso ou punido. Há um controle das redes sociais e em todos os lugares você pode estar sendo vigiado sem saber e ser levado à prisão, se falar contrário ao regime de Maduro.
