
Sabe aqueles dias de folga em que você, tão desacostumado a essa ligeira liberdade, não sabe aonde ir ou o que fazer? Foi assim que, ao circular pelo centro de Porto Alegre, acabei entrando na Biblioteca Pública do Estado, na rua Riachuelo. Percebi cenas totalmente diferentes da realidade atual, em um silêncio respeitador. Entre prateleiras longas e o cheiro de papel, vi um jovem estudante atento a um livro de direito. Por outro lado, uma senhora folheava devagar um romance de José Saramago. O silêncio era tão denso que dava para ouvir o virar das páginas.
E aí divaguei, sem a ajuda do meu celular desligado: em quantas vidas cabem numa biblioteca? Filosófico eu, não é? Mas ali está o passado de quem escreveu, o presente de quem lê e, talvez, o futuro de quem um dia se inspirou para mudar algo no mundo — ou em seu entorno — com citações e memórias de boas leituras. A biblioteca não é apenas um lugar de livros: é depósito de memórias, sonhos e esperanças. O contrário do que leio diariamente nas redes sociais. Por isso, compreendi aquele silêncio não como ausência de som, mas como presença de sentido.
A partir daquele momento, decidi descer a Rua da Ladeira e buscar, urgentemente, um café expresso. Lembro do pós-almoço com meus amigos e colegas de trabalho, sempre em cafeterias. Inevitavelmente, surgiam pautas extras criadas na simples observação dos frequentadores: aquele casal discutindo baixinho o preço do condomínio; as três senhoras que falavam tão alto que me dava vontade de entrar no assunto. Mas preferi imitar o homem solitário que, com um jornal aberto, fingia ler, mas só olhava para a rua.
Lembro das vezes em que visitei Arroio do Meio. Não fui à biblioteca, pois estava com a agenda apertada, mas relaxei com o café das padarias locais. Em todas, presenciei o cenário clássico em que a cafeína é apenas uma simpática coadjuvante. O principal está nos encontros. Uma mesa simples, sem decoração especial, pode ser o cenário da alegria, da despedida ou da rotina sem glamour. Talvez seja por isso que o café nos aqueça tanto — e até seja celebrado em uma data especial em outubro. Ele carrega, no fundo da xícara, a lembrança de que ninguém, em lugar nenhum, deveria viver sem compartilhar seus sonhos e experiências.

