
Desde que a magreza entrou na moda, é difícil encontrar quem não se importe com o volume da comida que ingere. Dizem que toda mulher (mas toda mesmo) sonha emagrecer pelo menos três quilos. E na estação das festas – que perigosamente se avizinha – tudo fica muito mais difícil… Ai, ai!
Estamos chegando ao ponto de entender mais de comida do que propriamente de comer. Aliás, foi-se o tempo em que comer bem queria dizer comer bastante. Sim, para quem não sabe, houve um tempo em que encher o prato era sinal de educação e repetir a sobremesa indicava bom caráter. Em contrapartida, até as crianças agora sabem que carboidratos têm de ser consumidos com cautela e que o açúcar pode ser danoso.
Você pode não acreditar, mas a lógica gastronômica que aí está é invenção recente. A nossa geração avaliava a mesa com bitola pré-colesterol. A gente, por exemplo, não escolhia o que comer. Comia o que aparecia na mesa. E só tinha chance de ir à mesa aquilo que estava na estação ou era produzido no quintal de casa. A lógica era outra, como eu disse. Ovo tinha fama de remédio. Doentes saíam curados pela força de esplêndidas gemadas – o suave creme de gemas bem batidas com generosas colheradas de açucar. Gordura fazia bem. Os adultos lustravam nela os bigodes satisfeitos e as crianças eram tratadas a pão recoberto por açúcar mais uma camada bem branquinha da melhor banha de porco. Veja só! O que hoje parece crime, antigamente tinha ares de virtude!
O resultado é que pertenço a um grupo forçado a se alfabetizar em nutrição fora da idade. Assim, se encontro recomendações alimentares, recorto com toda a devoção e estudo. E tenho de confessar que vou ficando progressivamente mais amedrontada do que satisfeita. Se me dizem para consumir frango depois de lhe arrancar a pele, eu faço. Quando falam para comer fruta em vez de sobremesa, eu tento.
Só me revolto com a sugestão de substituir por iogurte a incomparável maionese na salada de batatas.
De vez em quando, me rebelo pra valer. Fico perguntando aos meus botões por que ninguém calcula o prejuízo de viver contando calorias em vez de simplesmente afundar na glória de um pernil assado. Ou por que não se contabilizam os traumas deixados por uma gelatina diet, no lugar de um tiramissu legítimo.
E será, por fim, que o remorso que sucede a comilança não faz mais estragos à saúde do que a própria dita cuja comilança?

