O tempo instável esta semana remeteu-me à infância vivida no bairro Bela Vista. Na época era um acesso de chão batido, sem pavimentação. Dias de chuva eram sinônimo de barro que obrigava a levar um par de calçados extra na sacola, junto com os livros, o “penal” – que abrigava lápis, borracha e régua, além de um compasso. Na Escola Luterana São Paulo deixávamos os tênis embarrados no lado de fora para manter a sala de aula impecável.
Quando fazia frio de rachar, a geada fazia o contorno daquela espécie de canteiro que brotava no meio da estrada com o capim que conseguia se esgueirar dos pneus dos veículos. Era gelo em estado puro que exigia muito esforço para levantar, ainda escuro, para percorrer o trecho até a “vila”, como chamávamos a zona urbana de Arroio do Meio.
Lembro deste cenário também ao assistir na tevê notícias que tratam dos crônicos problemas do transporte escolar, chaga nacional na área de educação. Nos municípios agrícolas e também da zona de fronteira do RS, uma legião de crianças enfrenta uma rotina sacrificante para estudar.
Inexiste preocupação efetiva de muitos gestores que deveriam zelar pela formação intelectual destas gerações futuras. São eles que irão administrar nossas cidades, o Rio Grande, o país. O quadro atual faz prever o agravamento das injustiças, o aumento do fosso entre os que têm acesso a boas escolas daqueles que vão à aula apenas pelo lanche, a merenda como dizíamos nos tempos da dona Dorothéa Suhre na Escola São Paulo.
Pipoca com melado, pinhão, bergamota e laranja de umbigo são recordações para sempre
O frio que vai aportar no fim de semana na Província de São Pedro faz lembrar generosas bacias de pipoca lambuzada de melado ou açúcar, de poderosas paneladas de pinhão, das comidas encorpadas no jantar e do encontro em torno do fogão a lenha que dona Gerti Jasper pilotava com maestria em sua cozinha.
Relembro, saudoso, do meu pai colhendo bergamotas sem agrotóxicos, laranjas de umbigo que estavam ao serem partidas com as mãos e da safra de lima, fruta que nunca me atraiu, mas completava a relação de cítricos da casa. O velho Giba cuidava das plantas como extensão da família, sempre de olho no clima, providenciando irrigação no verão, proteção contra o frio e umidade nos dias gelados.
São reminiscências que me acompanham a cada estação, cada um de uma maneira marcante diferente que transmito com saudades a meus filhos. Nesta semana em que completei 57 anos, estes instantâneos imortais parecem cada vez mais atuais, servindo de inspiração para seguir adiante.

