Quando saí de Arroio do Meio para morar em Porto Alegre não imaginei que enfrentaria com a mudança. Na casa paterna tinha comida, roupa lavada, segurança e todas as necessidades atendidas. Amigos e colegas de aula preenchiam as horas de lazer. Pensei que seria apenas um novo endereço numa cidade maior onde a adaptação seria tranquila.
Ledo engano! Na primeira etapa morei com um amigo que mais tarde virou meu cunhado, o que minimizou as adaptações de um guri de 17 anos. Pouco tempo depois, porém, novas transformações: foi residir numa república, um apartamento onde moravam sete arroio-meenses, quase todos jovens, tentando ganhar a vida ou estudar.
Nos finais de semana ficava apenas na companhia do grande parceiro Vicente Petry enquanto os demais retornavam a Arroio do Meio. No começo da vida em Porto Alegre tudo era novidade. Havia pouco espaço para saudades. Aos poucos, no entanto, as mordomias de casa fizeram cada vez mais falta, juntamente com o afeto familiar.
Quando as luzes se apagavam para o último companheiro de república se recolher, era invadido por uma avassaladora melancolia. Cenas da terra natal, arquivadas na memória, desfilavam vívidas em meu pensamento. Detalhes, frágeis lapsos de episódios familiares, de confraternização com os amigos, escapavam sabe-se lá de onde, parecendo muito verídicas.
Morar sozinho permitiu escolher com critério os amigos e reconhecer com exatidão a importância da família
Nos momentos mais agudos eu costumava abraçar o travesseiro na escuridão para abafar as lágrimas e chorar copiosamente. Anos mais tarde confessei este hábito com alguns parceiros que compartilhavam que tinham o hábito de fazer o mesmo. Feito o desabafo, adormecia para encarar uma nova jornada de trabalho e estudos em São Leopoldo, na Unisinos no dia seguinte.
Meus filhos, de 21 e 23 anos, ainda residem conosco numa convivência que alterna discussões acaloradas com manifestações de carinho que, para mim, são oxigênio para me manter vivo. Tenho perfeita noção de que a vida deles fora de casa teria efeito construtivo de maturidade. Mas os tempos atuais, permeados pela crise e insegurança, impõem adaptações.
A permanência dos filhos até além da maturidade na casa dos pais é um fenômeno moderno que exige permanente adaptação. Idades e gostos diferentes criam exercícios diários de tolerância. Já a opção em morar sozinho cobra autodeterminação, dedicação e capacidade de adaptação, além de muito desassombro para enfrentar a solidão.
Morar sozinho, numa cidade grande e longe de casa, permitiu escolher com critério meus amigos, valorizar minhas conquistas e reconhecer como nunca a importância da família. E isso não tem preço!

