Conforme o site transcendemos.com.br, o termo trans é utilizado para se referir a uma pessoa que não se identifica com o gênero ao qual foi designado em seu nascimento. Quando se nasce, os gêneros são determinados pelo sexo. Contudo, algumas pessoas percebem que se identificam com outro gênero e passam a viver como assim desejam e se sentem melhor consigo mesmas.
Dessa forma, pode-se utilizar “mulher trans” ou “pessoa transfeminina” para se referir a alguém que foi designado homem, mas se entende como uma figura feminina. Já o termo “homem trans” ou “pessoa transmasculina” é indicado para tratar uma pessoa que foi designada mulher, mas se identifica com uma imagem pessoal masculina.
O cuidador Raphael Mörs, 23 anos, começou há quatro anos a transição hormonal. A cada aplicação, viu seu corpo mudando, ficando cada vez mais próximo de como se identifica. Ele ressalta que, neste processo, que não é nada simples, o apoio e aceitação da família e o respeito da sociedade, como um todo, são fundamentais. Raphael mora em Arroio do Meio com o pai, a mãe, o irmão mais novo e a noiva, de 22 anos.
“É literalmente uma descoberta, porque tu não te sentes bem contigo mesmo, mas quando tu descobres o motivo disso, é uma libertação. Foi vendo um outro homem trans que abri a minha mente e pensei: não me sinto bem com o corpo que tenho”, recorda. Raphael, que tem na sua família a sua base, relata que após o falecimento da avó, em 2014, entrou em depressão. “Comecei a fazer reiki, porque não me encontrei na religião e precisava de ajuda. Foi a própria terapeuta que perguntou: por que tu não escolhes um nome para ti? Começa com um agênero (de gênero neutro) e deixa o restante fluir”, conta Raphael. Naquele mesmo dia, um episódio em uma loja, onde foi tratado como “senhor”, com respeito, sem julgamentos, o fez ter a confirmação do que queria.
Quando contou em casa, primeiro foi ao pai. “Ele disse que se isso fosse me fazer feliz, ele seria feliz também”, me emocionei. “Já minha mãe fez muitos questionamentos, porque a maior preocupação dela era com o preconceito”, lembra. O avô, ainda vivo na época, ao saber, reagiu da mesma forma que o pai de Raphael e ele se emociona muito ao lembrar daquele dia. “Quando tu vês pessoas idosas que, muito mais pelo amor do que tudo, aceitam, é muito emocionante, isso é muito maior do que a sociedade e seus preconceitos”.
Ele analisa que a palavra-chave para todo esse processo é paciência, principalmente na questão da aceitação, por mais que a opção seja dele. Sempre muito reservado, observa que ser um homem trans não o impediu de ingressar no mercado de trabalho. Seu primeiro emprego foi de frentista de posto até que, depois, veio o convite para ser cuidador de uma senhora acamada.
A transição e a conquista da retificação de documentos
Há quatro anos Raphael faz a transição, que consiste na aplicação, a cada 21 dias, da solução injetável Deposteron (2ml). De início pensou em fazê-la pelo SUS, mas a pedido de sua mãe, a realizou de forma particular. Pôde consultar com um endocrinologista de Porto Alegre, com experiência em homens trans, que atende em Arroio do Meio, por meio de convênio firmado com o município. Ele elogia muito toda a receptividade e a disponibilidade para a realização deste processo.
Foi impossível conter o nervosismo para a sua primeira aplicação. Com ela, já foram percebidas mudanças, que foram progredindo ao longo do tempo. “Hoje, olhando no espelho, eu enxergo um caminho. Não estou pronto, mas sei que trilhei uma boa parte dele, não escondendo quem eu sou. Hoje me sinto 100% Raphael, porque me sinto bem assim”, acrescenta.
Sua primeira mudança pública de nome ocorreu nas redes sociais (Facebook), mas Raphael conta com muito orgulho que já tem a retificação de nome e gênero feita em cartório. “Quando fui ao cartório disseram que eu era o primeiro homem trans que estavam retificando. Na hora me emocionei, tremi, chorei. Já havia encerrado o Ensino Médio, retornei à escola, retifiquei os documentos de lá também”, descreve.
Para Raphael, a escolha de dar ou não a entrevista foi muito bem pensada e ponderada, em respeito à exposição de sua intimidade. Mas ele afirma que é por uma causa muito maior, pois é importante fazer a sociedade pensar temas como este, os comportamentos relativos e também esclarecer àqueles que, assim como ele, trilham esta caminhada de mudança. “As pessoas precisam entender que ser diferente é normal, que existem visões diferentes e que o que é certo para um, nem sempre é o certo para o outro, que somos seres humanos independente de tudo, merecemos respeito e empatia, julgar o próximo é uma construção social que precisa ser desconstruída. Se formos livres por dentro, nada nos aprisionará por fora,” encerra.