Foram apenas cinco dias na praia. Entre sol e chuva, retornaram com aquela cor de mandiopã (!) frito. Só a mulher e os dois filhos. O pai, por extrema dedicação ao trabalho, permanecera em casa – naquele branco azedo típico de quem compensa a frustração com cerveja e televisão em excesso. O choque epidérmico foi inevitável. Acharam que ele estava doente. “Viu? Ficou aqui, longe da família, sem alimentar-se direito e agora está aí, com essa cara de bicho sarnento”, lascou a patroa, sem piedade, abraçada ao fofo e saudoso cachorrinho.
Resmungou, porque é da natureza dele a rabugice. “Sol demais provoca danos irreversíveis a pele. Aliás, pensei que estivessem com saudades. Mas tudo bem, apesar de ter trabalhado o dia inteiro, vai ter churrasco.” A gurizada pouca atenção deu aos queixumes paternos. Estavam habituados, assim como já sabiam que os coroas se implicavam muito, mas se divertiam mais na hora de fazer as pazes. O resto eram carências mal resolvidas que o tempo, forçosamente cicatriza. Mesmo assim, tivera mais um veraneio sem a família.
Os amigos maldosos diziam que ele planejava cair na noite. E citavam aquele filme antigo, o “Pecado Mora ao Lado” (1955), do genial diretor Billy Wilder, que conta a história de Richard Sherman (Tom Ewell), um editor de livros que se sente “solteiro” quando a mulher (Evelyn Keyes) e o filho (Burch Bernard) viajam em férias. E fica cheio de ideias quando surge uma bela e sensual vizinha interpretada por Marilyn Monroe. É deste filme a famosa cena da loira platinada refrescando as bem torneadas pernas na saída de ar de um exaustor. Quem não ainda não assistiu, por favor! Busque no streaming mais próximo.
Wilder mostrava, lá nos anos 50, a fantasia recorrente no universo masculino: a volta aos tempos de solteiro. Liberdade! Sozinhos, muitos machos da espécie, sonham transformar-se em predadores. Mas lhes faltam garras e parceiros. Todos os amigos estão enjaulados, ou melhor, casados. No segundo dia solitários, deprimem-se em casa. Abrem antigos álbuns de fotos, sentem falta do cotidiano, que é repetitivo, mas agitado. E percebem que aquela rotina lhes dá uma reconfortante sensação de utilidade.
Assim, meu nada irreal personagem decidiu que no próximo ano, levará a turma a um passeio inesquecível. Seja qual for a proposta: Floripa, Balneário Pinhal ou Acapulco. Se é um bom profissional no trabalho, será igualmente um parceiro organizado para dividir compromisso e lazer. E já avisou: retornará igual a um mandiopã tostado, sabor camarão, com certeza.
OBS: Os jovens leitores não sabem o que é Mandiopã? É o pai brasileiro dos salgadinhos de hoje. Lançado no tempo em que os “chips” ainda não existiam, precisava ser frito – em óleo. Hoje, temos centenas de marcas, tipos e sabores. Eles vêm prontos, menos engraxados, mas cheios de sódio e gordura trans. Mas ainda existe o velho mandiopã – fabricado em Limeira (SP), por Antônio Gomercindo, segundo dono da fábrica e que nunca contou o segredo da receita, lá dos anos 30. E provem, com parcimônia, sem medo do pecado. Estou me referindo ao salgadinho, guris.