No final de semana passado, grande parte da gurizada do país participou do Enem. Por isso, nesta semana, reproduzo a opinião do jornalista e escritor Juremir Machado da Silva, publicado no Correio do Povo, da quarta-feira dia 26.
“É o sistema mais cruel já aplicado por um país contra os seus jovens. Está baseado na falsa justiça da meritocracia. Um país sério estabelece o escore mínimo a ser alcançado por um estudante para entrar na universidade e banca vagas para todos os aprovados. Esse conhecimento mínimo é exigido em nome do bom acompanhamento das atividades universitárias. Já o vestibular cria uma competição entre os adolescentes, isenta o Estado de abrir vagas para todos e gera a ideia de que só os ‘melhores’ devem chegar à universidade. O primeiro erro é pensar que os vencedores são, de fato, os melhores. Fazer a mesma prova no mesmo horário não estabelece igualdade na competição. As condições de preparação são profundamente desiguais. Salvo exceção, vence o que teve mais tempo e melhores condições de preparação. O vestibular reproduz a desigualdade social. A segunda falácia do vestibular diz respeito à ideia de que só os melhores devem entrar na universidade. Por quê? É uma concepção elitista, discriminatória e oportunista. Permite a um extrato social manter a ocupação dos melhores espaços da sociedade. A universidade deve receber todo mundo e ‘melhorar’ os menos bons ou os piores. Cada jovem deve ter o direito de ser ‘melhorado’ nos bancos do Ensino Superior. Deve ser fácil entrar na universidade. Difícil tem de ser a saída. A justificativa para a utilização do vestibular sempre foi a de que não haveria recursos para bancar todo mundo na universidade. É conversa fiada. Por trás dessa racionalização esconde-se a mentalidade meritocrática de reprodução do modelo social dominante. Aos ricos, a universidade. Aos pobres, o Ensino Técnico. Salvo, obviamente, as exceções que confirmam as regras. O Brasil ficará muito mais decente quando o vestibular acabar. Volta e meia alguém deixa escapar seu elitismo com um ‘agora qualquer um entra na universidade’ ou ‘o Ensino Superior já não é mais o mesmo, pois recebe todo mundo’. É isso aí. A universidade precisa receber qualquer um. Exames de saída do Ensino Médio também são seletivos. Podem ser feitos por fileiras (científica, literária, ciências humanas). Para vencer em cada fileira é adequado fixar um rendimento mínimo em certas matérias. Todos que atingem a meta passam a ter direito a uma vaga. Claro que é mais fácil jogar os jovens numa luta fratricida e lavar as mãos. Chama-se isso de seleção dos melhores. O Enem precisa transformar-se no exame único de saída do antigo Segundo Grau e de entrada no mundo do Ensino Superior. As resistências são óbvias. É muito mais simples organizar tudo como se fosse um campeonato com troféus para quem faz mais gols. Só que é injusto. A época do vestibular passou. Já é tempo de um novo tempo.”