As acadêmicas da Univates Bruna Jordon (Biomedicina) e Francieli Winck (Letras) retornaram para Arroio do Meio no último domingo após passarem duas semanas na cidade de Curralinho, no Pará, onde participaram, de 5 a 22 de julho, de mais uma edição do Projeto Rondon. O grupo do Vale do Taquari esteve acompanhado pela Universidade Estadual de Maringá, integrando a Operação Açaí. As principais atividades realizadas pelos alunos da Univates estiveram focadas na educação ambiental, artesanato, turismo e inclusão digital.
A viagem foi tranquila e com escalas, no Rio de Janeiro (ida) e em Brasília (volta). Ao chegarem a Belém, os universitários foram encaminhados ao Centro de Instruções Almirante Braz de Aguiar (Ciaba) onde ficaram alojados por dois dias. “Nestes dois dias foram repassadas informações pertinentes ao projeto, bem como a abertura do Projeto Rondon – Operação Açaí. Na noite de sábado, iniciamos a viagem no navio da Marinha até o município de Curralinho, viagem que levou aproximadamente 20 horas. Em Curralinho fomos encaminhados à uma escola municipal onde ficamos alojados durante todo o período que estivemos por lá”, conta Bruna. A estudante de Letras ressalta que o primeiro dia foi de socialização e reconhecimento das necessidades do local. “Em Curralinho fomos bem recepcionados, mas ao chegarmos tivemos um grande impacto, pois a realidade é muito diferente da que vivemos”.
Durante a permanência no Pará, as alunas desenvolveram diversas atividades em formato de oficinas. A maioria das oficinas de Bruna foram realizadas em comunidades onde o acesso era feito apenas de barco. “Algumas delas ficavam a três horas de distância da sede de Curralinho. Os temas das minhas atividades eram referentes à saúde humana (diabetes, hipertensão, doenças endêmicas, parasitoses, doenças mentais e doenças sexualmente transmissíveis)”.
Já Francieli teve suas oficinas voltadas para a área da informática, motivação e elaboração de projetos. Na oficina de Informática para jovens e adultos, foi o primeiro contato que a crianças tiveram com o computador. “Isso foi muito gratificante, pois pudemos observar de perto o entusiasmo e motivação ao realizarem as atividades propostas. Os jovens e adultos também tinham pouco contato com o computador, basicamente internet. O conhecimento era deficiente, por isso desenvolvemos encontros para suprir essas carências”. Nas demais oficinas foram construídos coletivamente projetos que se adequem as necessidades da realidade local e, que posteriormente possam ser implantados; mostrar a importância da reciclagem e de conservação do meio ambiente por meio da confecção de diferentes utensílios e brinquedos com materiais reciclados e momentos de reflexão para discutir as potencialidades do ser humano.
Impressões da cidade
Curralinho possui aproximadamente 30 mil habitantes. O clima é bastante quente e úmido e a cidade carece de serviços de saneamento básico. Sua economia está baseada no açaí e na pesca. Lixos são depositados em frente às casas e nas ruas. “Não há conscientização da população quanto à importância de recolhimento de lixo, destino adequado de esgoto e organização do ambiente, prejudicando assim a saúde. O local é uma das áreas de grande foco da malária e leishmaniose. Além disso, as famílias têm geralmente muitos filhos e, dependem de programas do governo. As crianças em sua maioria frequentam a escola não com o interesse em aprender e estudar, mas por conseguirem o benefício do Bolsa-Família”.
Bruna frisa que uma das primeiras impressões que o grupo teve foi de uma cidade ribeirinha, com muito lixo, sem saneamento básico e o pior, sem água potável. “Passados os primeiros dias fomos nos acostumando com o calor de quase 40° e também àquela realidade e conhecendo melhor a população, que sempre se demonstrou muito receptiva e com uma alegria invejável. O engraçado é que a população come açaí junto com o arroz, feijão, carne e farinha, bem diferente daqui. Também sentimos falta de frutas, pois como se trata de uma cidade ribeirinha, todas as mercadorias chegam apenas de barco, fazendo o preço subir nas alturas”.
A principal dificuldade enfrentada foi a ausência de água potável no município, a água era apenas encanada para as casas sem passar por nenhum tipo de tratamento. “Ganhamos da Marinha comprimidos de cloro para colocar na nossa água, porém, na maioria das vezes compramos água mineral. Porém na comida, não tínhamos o que fazer comíamos a comida feita com aquela água, motivo que fez muitos rondonistas adoecerem”, conta Bruna.
Outro detalhe que chamou a atenção foi o matador de boi que ficava ao lado do rio. Ele tirava as partes do boi e as que não queria eram atiradas no rio, ou levadas para a margem e atiradas para os cachorros. Os demais pedaços eram levados para um açougue onde eram expostos em temperatura ambiente, sem qualquer tipo de refrigeração e com muitas moscas no seu redor. Margarina, mortadela, presunto, nada ficava refrigerado, tudo em temperatura ambiente de 40°.
“O que chamou a minha atenção foi a pouca quantidade de carros na cidade, aproximadamente uns 15. O transporte na sede é realizado basicamente de motos. Não há Detran, e as pessoas não sabem o que é ter carteira de motorista, não usam capacete e muitas vezes estão entre três ou quatro em uma moto”, frisa Francieli. A comunicação com os familiares era feita somente pelo telefone, pois os rondonistas tinham pouco acesso à internet.
Aprender mais do que ensinar
Para Francieli, a participação no Projeto Rondon foi algo singular e único. Uma experiência inesquecível e muito significativa com troca de conhecimentos e amizades. “Tenho a certeza de que aprendi muito sobre a cultura do povo ribeirinho, mas volto com outra consciência e com a percepção do quão importante é desenvolver este tipo de atividade em comunidades carentes, quando podemos oferecer felicidade e um pouco de aprendizagem. Não há palavras e imagens que possam retratar o estilo de vida do povo de lá, me dá um grande aperto em pensar que podem ser tão felizes mesmo com tão pouco e tão poucas condições de vida. Desta forma levo comigo a importância de valorizarmos principalmente as pessoas que estão a nossa volta e sempre que pudermos, tentar multiplicar o bem”.
A futura biomédica Bruna tem a certeza de que aprendeu muito mais do que ensinou, voltando de lá com os valores de vida modificados de forma significativa. “Participar do Rondon mudou a minha vida, pois não basta apenas olhar o mapa do Brasil pendurado na parede ou aberto sobre a mesa de trabalho e ficar apontando os locais de risco e com maiores problemas, é preciso caminhar sobre ele para sentir de perto suas angústias, suas esperanças, seus dramas ou suas tragédias e assim reafirmar a fé na nacionalidade. Acabado o Projeto Rondon, posso dizer com toda certeza de que todo o esforço valeu a pena e que poder mudar nem que seja um pouquinho a realidade daquela população tão isolada já fez a diferença, tanto na nossa vida, quanto na deles”.