Numa eleição em que os institutos de pesquisas nunca erraram tão feio, nem passando raspando no poste, cabem algumas reflexões sobre o assunto.
Uma delas é do colunista da revista Veja, Reinaldo Azevedo, que faz uma análise dos fatos. É da área e tem propriedade para falar sobre isso.
“Vamos lá. É claro que os institutos de pesquisa terão de se perguntar o que deu tão errado desta vez. E não há como disfarçar, ainda que queiram. Para a sua própria credibilidade, melhor fazer um meia-culpa e rever o método. Adicionalmente, os responsáveis devem voltar a atuar com mais discrição, opinando menos, dando menos entrevistas, abstendo-se de fazer previsões, ocupando-se mais de sua ciência. Há, sim, um maior número de acertos do que de erros quando se consideram as eleições presidenciais e as disputas estaduais. Ocorre que os erros não são nem corriqueiros nem irrelevantes. Um dia antes da eleição, o Datafolha, por exemplo, antevia que Dilma Rousseff obteria 44% dos votos válidos; o tucano Aécio Neves, 24%, e Marina Silva, do PSB, 22%. Contabilizadas as urnas, Dilma ficou com 41,59%, e Marina, com 21,32%. Sem dúvida, estão na margem de erro, de dois pontos para mais ou para menos. Mas Aécio marcou 33,55% nas urnas — 7,55 pontos acima da margem superior de erro prevista pelo Datafolha. Como votaram 115.122.611 pessoas, estamos falando de um universo de 8.691.757 eleitores.
Olhemos agora o Ibope de sábado: Dilma, dizia o instituto, teria 46% dos votos válidos; Marina, 24%, e Aécio, 27%. Só a peessebista está de acordo com a previsão. Com 41,49%, Dilma obteve 2,1 pontos a menos do que a margem inferior de erro, que era de 44%, e Aécio, com os seus 33,55%, 4,55 pontos a mais do que a margem superior, que era de 29%.
Nesse caso, o erro remete a 5.238.078 eleitores.
Os institutos dizem trabalhar com um intervalo de confiança de 95% — isto é, se repetida 100 vezes, em 95, os números colhidos estariam dentro da margem de erro. No caso, os dois não deram sorte e caíram justamente nas cinco possibilidades em 100 de errar.
Tudo bem: a gente pode acreditar que existiu uma onda, uma bolha, seja lá como se queira chamar. É uma forma de tentar jogar a responsabilidade pelo erro de cálculo nas costas do eleitor. O fato é que esse não é o único erro, né? Vejam o caso do Rio Grande do Sul. Entre 1º e 3 de outubro, o Ibope colheu os seguintes votos válidos no Estado: 40% para Tarso Genro, do PT; 31% para Ana Amélia, do PP, e 23% para José Sartori, do PMDB. E o que se viu? 40,4% para Sartori; 32,57% para Tarso e apenas 21,79% para Ana Amélia. O Datafolha, também um dia antes da eleição, não se deu muito melhor: 36% para o petista e 29% para os dois outros. O Ibope voltou a errar feio a boca de urna também. Atribuiu 29% ao candidato que obteve 40,4%.
Esses são apenas alguns erros, os mais salientes. Há, sim, outros. Não estou entre aqueles que querem criar dificuldades para a divulgação de pesquisas, até porque é inegável que elas, no geral, captam os grandes movimentos de opinião pública. Ocorre que elas falam em nome de uma ciência, com margem de erro, com intervalo de confiança, e os institutos, pois, devem explicações mais sérias do que simplesmente atribuir seus erros de percepção a uma mudança de humor do eleitorado.
Mais: é preciso que a gente considere que números, quando divulgados, interferem nas estratégias dos partidos, alteram a formação de palanques, criam dificuldades ou facilidades para arrecadar recursos, animam ou desanimam a militância. O que fazer? De saída, sugerir a todos mais prudência. Uma semana antes da eleição, tentou-se até criar onda afirmando que Dilma, por exemplo, poderia vencer a disputa no primeiro turno… A minha primeira sugestão é que as empresas controladoras dos institutos proíbam seus técnicos em pesquisa de se comportar como analistas políticos. Como diria Fernando Pessoa, não existe técnica fora da técnica.”