O novo formato do Ensino Médio, sancionado na semana passada pelo presidente Michel Temer vai ser implantado só a partir de 2019. Mesmo assim, em algumas escolas a preocupação com determinados detalhes já existe.
Aprovada na última semana pelo Senado, a nova legislação prevê que o currículo seja 60% preenchido pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e que os 40% restantes sejam destinados aos chamados itinerários formativos, em que o estudante poderá escolher entre cinco áreas de estudo: linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas e formação técnica e profissional. O projeto prevê ainda que os alunos escolham a área na qual vão se aprofundar já no início do Ensino Médio.
As escolas não são obrigadas a oferecer aos alunos todas as cinco áreas, mas devem oferecer ao menos um dos itinerários formativos. Durante a tramitação na Câmara, o projeto retomou a obrigatoriedade das disciplinas de educação física, arte, sociologia e filosofia na Base Nacional Comum Curricular, até então fora do texto original.
A proposta apresenta também uma meta de ampliação da carga horária para pelo menos mil horas anuais e, posteriormente, chegar a 1.400 horas para as escolas do Ensino Médio. Hoje são 800 horas. Elas devem ampliar a carga horária para cinco horas diárias – atualmente são obrigatórias quatro horas por dia. A intenção é que progressivamente amplie-se a carga horária para sete horas diárias, para ofertar educação em tempo integral. Para viabilizar essa ampliação, será disponibilizado apoio financeiro do governo federal.
Outra mudança foi a permissão para que profissionais com notório saber, mas sem formação acadêmica específica, possam dar aulas no ensino técnico e profissional. Com isso, um engenheiro, por exemplo, poderá dar aulas de matemática ou física.
O próximo passo é implantar a Base Nacional Comum Curricular que, atualmente, está sendo elaborada por um comitê presidido pelo Ministério da Educação.
Cedo para avaliar
A titular da 3ª Coordenadoria Regional de Educação, Greicy Weschenfelder, observa que a reforma já vinha sendo debatida desde 1997 e que vem como uma estratégia para minimizar os indicadores negativos que o Ensino Médio vem obtendo. Avalia que ainda é muito cedo e prematuro para emitir opinião se vai dar certo ou não.
Contudo, diz que é uma reforma que no seu DNA quer dialogar com o jovem e reforçar as disciplinas cujos domínios são imprescindíveis. “Quer colocar nosso Ensino Médio em poucos anos em melhores posições no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA) e em outros exames. Além disso, visa diminuir taxas de abandono na escola. Um objetivo que dá para perceber é que essa reforma flexibiliza o currículo atual que é excessivamente acadêmico (13 disciplinas), extenso e superficial e desconectado do mercado de trabalho”, esclarece.
Uma das preocupações, em âmbito de Estado, é com a estrutura das escolas, a fim de atender a esse público de forma gradual. Como exemplos cita as redes de wi-fi para usar tecnologias e a valorização a nível de país dos professores.
Professores também serão afetados
Para a diretora da Escola Estadual de Ensino Médio Monsenhor Seger, de Travesseiro, Sandra Regina Hermann Haas, a reunião com a 3ª CRE na semana passada deixou os professores um pouco mais tranquilos, já que a reforma deve ser implantada somente a partir de 2019. Mas a tensão ainda ronda os professores, especialmente os que são formados em áreas que deixam de ser obrigatórias ou estão em final de carreira. Como algumas disciplinas serão optativas, alguns terão de se deslocar para outras escolas a fim de completar a carga horária.
Outra preocupação é quanto à estrutura da escola. Hoje a Monsenhor Seger não teria condições de atender os alunos do Ensino Médio em tempo integral. “Teria que ter uma reestruturação geral, não só na parte teórica e de recursos humanos, mas principalmente na estrutura. Não basta fazer uma reforma se a escola não tem condições de receber bem os alunos”, observa, salientando que as mudanças são necessárias, mas poderiam ser feitas de uma forma diferente, pensando na reestruturação física das escolas e no quadro de professores.
A diretora ainda chama a atenção para o fato de que não será mais possível que o aluno trabalhe de dia e estude à noite, já que a carga horária será ampliada. Hoje a escola atende 58 alunos no Ensino Médio, exclusivamente à noite. Muitos destes alunos trabalham para ajudar a família. “Nossa preocupação é com o resultado final e isso, como será, eu não sei. Só o tempo dirá”.
Alunos podem escolher errado
Na Escola Estadual de Ensino Médio Pouso Novo, a diretora Marli Ferronato aponta mais uma preocupação. A falta de preparo dos alunos para escolher as disciplinas optativas. Ao ingressar no Ensino Médio, os alunos, na sua maioria, não decidiu que carreira seguir. Com isso, muitos podem optar pelas disciplinas que exigem menos esforço em detrimento a outras mais exigentes e, lá na frente, dependendo da escolha da profissão, o conteúdo deixado de lado pode fazer falta. “Teria que se trabalhar o aluno para ter capacidade de escolha. Antes de vir a reforma teria de preparar o aluno e os professores que talvez fiquem sem turma. Se os alunos optarem por uma área, outra talvez nem tenha alunos. E como fica o professor?”, questiona.
A estrutura do educandário não seria um problema, já que o prédio é grande. Hoje a escola atende 150 alunos, do 1º ano do Ensino Fundamental até o 3º ano do Ensino Médio, exclusivamente de dia. No Médio estudam 35 alunos.
Muitos detalhes a serem discutidos ainda
Na Escola Estadual de Ensino Médio Guararapes, de Arroio do Meio, os estudantes do Ensino Médio representam mais de 80% do total de 505 alunos. A diretora Silvana Hanke diz que é necessário conhecer a proposta de forma aprofundada e esperar por mais orientações da mantenedora, já que o novo formato só será implementado a partir de 2019.
No entanto, algumas questões preocupam. O espaço físico para o contraturno não seria uma dificuldade, já que a escola dispõe de um prédio grande. Mas junto com esse aumento no tempo que os estudantes vão estar na escola, vem a questão financeira. Os custos para a manutenção da estrutura se elevam, passando pelo material de higiene e limpeza até a merenda. “Tudo isso tem que ser pensado”, avalia.
Quanto às mudanças no currículo diz que é uma proposta nova e que vem com um ideal maior. A única dificuldade que a diretora visualiza é em como atender a demanda dos 40% formativos de acordo com o interesse dos alunos, conciliando com o quadro de professores. Contudo, acredita que ainda haverá debates e orientações e que as dúvidas serão dirimidas no decorrer do período.
Silvana lembra que o Ensino Médio ficou por muitos anos sem mudanças e que a implantação do Ensino Politécnico foi um primeiro passo. As reestruturações em âmbito estadual continuam acontecendo, com uma série de mudanças sendo iniciadas neste ano.