O ano que recém iniciou deve ser de reação da economia brasileira. A gerente da Inovates – Incubadora Tecnológica e presidente do Conselho de Desenvolvimento do Vale do Taquari, a economista Cintia Agostini, acredita que as pessoas voltem a consumir e os empresários retomem os investimentos. No entanto, ressalva que as decisões políticas, o que inclui candidaturas, podem influenciar a economia.
Para o Vale do Taquari, Cintia projeta um ano positivo em função da diversificação econômica. A cadeia leiteira ainda deve enfrentar dificuldades, em função do baixo preço pago pelo leite, enquanto que outros, podem se expandir.
Em entrevista ela fala sobre economia, a concessão da BR-386 e os pedágios, a crise do leite e eleições.
Jornal o Alto Taquari – 2017 foi um ano de muitos desafios para a economia brasileira. O que se pode esperar para 2018, teremos uma reação?
Cíntia Agostini – Depois de dois anos de quedas na economia brasileira, 2015 (-3,8%) e 2016 (-3,6), o ano de 2017 que irá terminar novamente com um pequeno indicador positivo, ou seja, a economia irá crescer menos de 1%, mas inverte a curva de decréscimo. No entanto, temos mais de 12 milhões de pessoas desempregadas e uma pressão salarial para baixo. O salário mínimo anunciado nem recupera a inflação que já ocorreu.
Mesmo assim as pessoas estão mais otimistas, a impressão que tenho é que passou o “susto” e o temor inicial e as famílias se adaptaram a uma nova realidade, ou seja, a novos patamares de consumo. Estão tentando pagar as contas que já tinham e muitos postergaram compras de imóveis e automóveis, ou seja, mudaram seus planos conforme suas rendas.
Esse ano de 2018 tende a ter um PIB maior, ou seja, se discute um PIB de 2 a 2,5% para 2018, pois as pessoas voltam a consumir conforme já explicitei e os empresários, que já ficaram dois anos postergando investimentos, buscam retomar seus negócios a pleno.
No entanto, o “humor econômico” que tentou se distanciar dos reveses políticos, irá voltar a se associar. Isso ocorre pois as decisões de reformas e políticas mais amplas devem acontecer todas no primeiro semestre, mas já teremos vários pretendentes a cargos eletivos lançando suas candidaturas, isso fará que a cada discurso de um destes, o mercado financeiro e das grandes empresas se movimente positiva ou negativamente. Mesmo as pequenas empresas e as famílias supondo que isso não nos influencia, influencia sim, pois irá determinar a dinâmica econômica brasileira neste ano. Finalmente, será um ano econômico melhor que 2017 sim, mas será um ano muito tenso politicamente e temos que ter sobriedade suficiente para vivermos adequadamente.
AT – O ano também foi de dificuldades em setores específicos, como o de lácteos, sendo que produtores e indústrias amargam prejuízos. Qual o impacto dessas dificuldades na economia regional? Como isso contribui para que famílias desistam da atividade rural?
Cíntia Agostini – O setor lácteo foi um dos mais prejudicados no ano de 2017, não só por causa da queda no consumo da população, mas principalmente pelas decisões do governo do Estado do RS e da União em se tratando desse setor, que desestimularam as famílias produtoras.
No Estado conseguimos manter os decretos de redução de ICMS para importação, até o final do ano postergados. Contudo, é necessário que estes sejam extintos e não haja estímulo para importação de leite em pó.
Além disso e mais importante que isso, que a União, que estimulou consideravelmente a importação de leite em pó, fundamentalmente do Uruguai, mude essa política econômica, mas até o momento não temos nada que demonstre que fará isso, na verdade, os poucos movimentos positivos que tivemos no ano passado, tiveram recuo no final do ano.
No final do ano o preço do leite definido pelo Conseleite, depois de aumentar em novembro, novamente baixou em dezembro, ficando em R$ 0,837. Isso devido a nova liberação das importações que citei acima, ou seja, se o custo do produtor gira em torno de R$ 0,98, receber R$ 0,84 fica explícito o desestímulo….
Sabemos que todas as nossas lutas de 2017 fizeram com que a situação não fosse pior, mas não avançamos nas condições que precisamos avançar.
Na nossa região que é de pequena propriedade, são as outras atividades das famílias produtoras que estão sustentando a cadeia leiteira e aquelas que têm somente leite como atividade ou já desistiram ou irão desistir dentro em breve, caso não se altere as condições atuais.
E para piorar, a sugestão do Conseleite é que se diminua a produção de leite para aumentar o preço. Oras, como faremos para as vacas pararem de produzir? Deixando o sarcasmo de lado, alguns anos atrás os produtores foram estimulados, fizeram dívidas e investiram para aumentar a produção e produtividade e agora a indicação para estes é diminuir produção… como farão para se manter?
Temos que continuar trabalhando, não desistimos das nossas pautas:
Pautas a serem demandadas para o Estado do RS:
extinção imediata dos decretos estaduais que possibilitam importação vantajosa de leite em pó, devido aos benefícios de ICMS;
revisão das políticas de incentivo às empresas atraídas para o Estado que importam leite em pó;
Pautas a serem demandadas para a União:
compra imediata de leite, para diminuição dos estoques existentes;
determinação de cotas de importação para o leite em pó uruguaio;
desincentivos à guerra fiscal entre os Estados, pois o RS vende 60% da sua produção de leite para outros estados, desembolsando diferenças de ICMS para efetivar essas vendas.
AT – A diversificação da atividade econômica do Vale do Taquari é vista como uma característica positiva da Região. Quais segmentos estão mais propensos a terem bons resultados no decorrer de 2018?
Cíntia Agostini – É positiva e novamente nessa crise econômica ficou demonstrado isso. Os setores do agronegócio terão que inovar e empreender. Criar produtos com características diferenciadas a partir das nossas agroindústrias, das indústrias de alimentação e setores vinculados.
Além disso, o turismo será um setor a ser desenvolvido e estimulado no ano de 2018 e tem muito por crescer. O setor moveleiro também é um setor qualificado e diferenciado. O setor de confecções e moda é um a ser explorado. Os setores de higiene e limpeza tem se caraterizado com boas possibilidades regionais, além de outros já existentes e que podem avançar (tecnologias de hardware e software, bebidas, químico, metal-mecânico, entre outros). Um que deve iniciar para ser desenvolvido ao longo do tempo é o setor de saúde (equipamentos e tecnologias).
AT – Um dos assuntos mais debatidos pelo Codevat no decorrer de 2017 foi a concessão da BR 386 e a consequente instalação de pedágios na via. Que avanços se teve neste sentido?
Cíntia Agostini – Esse ano de 2018 esse tema continuará em nossas pautas. As últimas ações presenciais foram uma ida a Brasília para tratar do tema no Ministério dos Transportes e Tribunal de Contas da União (TCU). As informações mais atualizadas dão conta que o relatório técnico do TCU foi terminado e agora em janeiro passará no pleno do TCU para oficializar o parecer do Tribunal. O Ministério dos Transportes tem vários itens a verificar, mas não conhecemos ainda o conteúdo do relatório. A pretensão do ministério é lançar esse edital entre fevereiro e março deste ano, mas agora temos que conhecer as condições dos relatórios do TCU e como o Ministério irá encaminhar o assunto. Se confirmado o edital, após o processo licitatório, teríamos a contratação da empresa concessionária em setembro ou outubro de 2018. Depois de contratado, eles têm até um ano para fazer as obras básicas na rodovia (recapeamento, sinalização, etc), para deixar a rodovia em condições mínimas, além da construção das praças, para somente depois disso começar a cobrança, ou seja, estamos falando na melhor das hipóteses em cobrança a partir do segundo semestre de 2019. Continuaremos trabalhando no tema, inclusive depois que a concessão acontecer.
AT – Em todo ano eleitoral se reascende o debate acerca da necessidade do Vale ter um representante na Assembleia Legislativa e na Câmara dos Deputados. Por que é importante para a Região estar politicamente representada? Por que o Vale do Taquari, economicamente tão desenvolvido, não consegue se unir em torno dessa demanda?
Cíntia Agostini – Somos uma região politizada e organizada, nossa história associada e cooperada fez com que a região se desenvolvesse dinamicamente e economicamente, as pessoas que vivem aqui gostam do Vale do Taquari e outros se mudam para cá, querendo viver com a qualidade de vida que a maioria de nós consegue ter. Não é regra, mas em geral, temos bons indicadores sociais e econômicos, que demonstram essa condição boa de viver no Vale.
Por ser uma região organizada, por vezes se considera relativamente autônoma, ou seja, que é dinâmica sem precisar das representações e isso faz com que tenhamos dificuldades em eleger uma representatividade regional.
Por óbvio, é legítimo que todos os partidos queiram ter representações e isso faz com que várias opções surjam novamente no Vale. O que podemos indicar para nossos leitores é que verifiquem nossos candidatos, vejam o compromisso que possuem com o Vale, para então podermos trabalhar com essa perspectiva regional. Além disso, o Codevat fará em março novamente, como fez nas eleições passadas, uma discussão para definir prioridades regionais e entregará essas aos candidatos, solicitando compromisso dos mesmos para com os temas de interesse do Vale do Taquari.