Clarice Wahlbrink, 54 anos, agricultora residente em Palmas, Arroio do Meio, retrata bem a realidade de muitas propriedades rurais. Das cinco pessoas que moram na casa, apenas ela trabalha na agricultura. O marido e o três filhos trabalham fora.
As mãos calejadas retratam bem os desafios do dia a dia. Sozinha ela dá conta de plantar alimentos para a família e para os animais que possui: duas vacas leiteiras, que também são mansas de canga, três bezerros que cria para engorda e mais uns porquinhos. Para isso precisa preparar a terra, o que inclui arar, adubar e plantar e depois colher. Todas essas tarefas são feitas de uma forma cada vez menos comum no interior: com o uso de carroça e arado tracionados pela junta de vacas. Clarice diz que está acostumada a estar sozinha nestas atividades. Cresceu ajudando a família na lida rural e sempre conciliou a casa e a criação dos filhos com a agricultura.
Toda a produção da propriedade é para subsistência. Para complementar a renda faz rapaduras, pão de milho e doces para vender na banca às margens da ERS-130. O carro chefe são as rapaduras de melado e chocolate. O melado, quando consegue cana, é produzido pela família e o amendoim precisa ser comprado porque os pequenos animais que habitam o mato próximo da propriedade comem tudo, inviabilizando o plantio. Diz que o domingo é o dia que mais tem movimento. Tem clientes que são velhos conhecidos, passam todas as semanas. Alguns fazem até encomendas.
No meio da entrevista uma motorista para, pede o preço de todos os produtos e insiste por um desconto. A agricultora, pacientemente explica que se ela baixar o preço não tem lucro nenhum e então a mulher vai embora sem levar nada. Sem esconder a chateação, Clarice conta que desde que iniciou o plano Real vendia a rapadura a R$ 1. Mas agora, com tudo subindo teve que mudar. Até tinha reduzido um pouco o tamanho, mas aí os clientes incentivaram para que ela fizesse um pouco maior e cobrasse R$ 2. E assim o fez e continua com sua clientela.
Concilia a agricultura e os afazeres domésticos com a banca há cerca de 17 anos. O ponto de comércio existe no local há cerca de 70 anos, foi passando de geração para geração, e hoje lhe dá um retorno razoável. As cerca de três horas que dedica para a venda de seus produtos lhe rendem, em média R$ 30, por tarde. Quando chove ou faz muito calor, como no alto do verão, não leva seus produtos para vender na ERS-130. Diz que geralmente no domingo há maior movimento e um resultado financeiro melhor. “Às vezes me dizem: por que tu não descansa no domingo? Mas eu penso que é o dia que mais vendo, não posso perder. As vezes para bastante gente, outras um pouco menos, mas sempre se vende bem no domingo”.
Acostumada com a vida que leva, diz que todo o estresse fica para trás quando as mãos mexem com a terra. Enquanto agricultora considera que a situação não é das mais animadoras para a classe, especialmente para quem produz leite que cada vez tem menos retorno. Apesar das dificuldades, diz que não pretende trabalhar fora. É ali, às margens da ERS-130, no quilômetro 86, onde o verde contrasta com o asfalto e o barulho dos carros e caminhões com as folhas que balançam com o vento, que Clarice faz sua vida acontecer.