Por Gian Oliveira
No começo dos anos 2000, a internet era uma promessa de inovação sem limites. Os blogs pipocavam como diários digitais, o Orkut reunia comunidades de interesses improváveis e os primeiros sites ainda tinham um charme rudimentar. Quem se aventurava na criação digital precisava de um toque autoral. Produzir um texto, desenhar um layout ou até criar um vídeo exigia mais do que apenas apertar botões – demandava um olhar próprio, uma identidade.
Com o tempo, a tecnologia nos deu atalhos. Os templates facilitaram os sites, os filtros deixaram as fotos impecáveis, os aplicativos agilizaram a produção de conteúdo. Se antes cada criação era um reflexo da personalidade de quem a fazia, agora bastava escolher um modelo pronto, trocar as cores e chamar de “original”.
E então, veio a inteligência artificial. Se antes a criatividade era uma mistura de repertório e esforço, hoje ela pode ser gerada em segundos. Escreva uma frase no prompt e pronto: textos, artes, vídeos, vozes, músicas, tudo materializado com precisão cirúrgica. Mas onde está a alma nisso tudo?
Vivemos um paradoxo. Nunca foi tão fácil criar, e nunca criamos tão pouco. O excesso de referências geradas por IA torna tudo parecido, previsível, sem nuances. As redes sociais viraram vitrines de conteúdos idênticos, com os mesmos cortes, as mesmas legendas, os mesmos rostos impecavelmente filtrados. Até os pensamentos soam repetidos, encaixados em frases de impacto que já vimos mil vezes antes.
A superficialidade tomou conta da criatividade. Como um oceano raso, onde há muita extensão, mas pouca profundidade. O desafio agora não é apenas criar, mas resgatar a autenticidade. Encontrar um jeito de não ser apenas mais um no meio do ruído digital.
Porque a tecnologia pode dar atalhos, mas a identidade ainda precisa ser construída. E isso, felizmente, nenhuma IA pode copiar.