Um desafio para a comunidade de Arroio do Meio
A recente catástrofe climática que atingiu o Rio Grande do Sul em maio de 2024 deixou um rastro de destruição. Um dos locais mais afetados foi o prédio da Secretaria de Educação no Centro de Arroio do Meio. Centenas de livros, documentos e arquivos, que guardam a memória e a história da rede de ensino municipal bem como a história da região, foram severamente danificados pela enchente, comprometendo irremediavelmente parte do acervo local. Na situação de calamidade e na gravidade dos fatos naquele momento, o professor de História e coordenador do Museu Público Municipal de Arroio do Meio – Casa do Museu, Sérgio Lopes percebeu a urgência em remover do local, juntamente com um grupo de colegas e professores, tudo o que fosse possível. O transporte foi feito com cuidado até o museu, que naquele contexto abrigava o CRAS, o Conselho do Idoso e outras repartições igualmente atingidas pelas águas. Estima-se que aproximadamente 500 kg de documentos molhados e embarrados foram deslocados para o museu, para serem, na medida do possível, recuperados.
Os documentos, muitos deles únicos, foram molhados pelas águas e pelo espesso lodo da enchente, o que resultou em danos significativos. A preservação desse material exige um cuidado especializado. É nesse cenário que o historiador Sérgio Lopes tem se dedicado à restauração dos documentos.
O desafio da Restauração
De acordo com Lopes, a restauração de documentos históricos é um processo delicado e que demanda tempo. “A água danifica a estrutura do papel, tornando-o quebradiço e vulnerável. Cada documento precisa ser tratado com técnicas diversas para preservar o máximo de informação possível. O processo não é rápido, requer paciência e técnicas específicas”, explica o professor. A Casa do Museu, que é um ponto de referência cultural e histórico para a cidade, passou a ser também um espaço de restauração, visto que dois dias após a catástrofe, não havia outro espaço adequado para armazenar os materiais resgatados. “Levamos isso para o sótão do museu e começamos a classificar os materiais em três categorias: muito afetados, afetados e pouco afetados pela lama. Estávamos em um verdadeiro cenário de guerra”. Relembra o professor. Após esta primeira separação, os funcionários do museu e os voluntários que estavam realizando a triagem, perceberam a presença de fungos, o que poderia acelerar o processo de decomposição e corrosão dos materiais. A alternativa encontrada foi de armazenar em congeladores os materiais, assim, cuidadosamente, com tempo e com calma, foi preciso descongelar e começar o processo de secagem e restauro. “Me recordo que foram trocadas inúmeras mensagens no grupo de WhatsApp que temos com profissionais da área de restauração da 2ª Região Museológica do Rio Grande do Sul. Foi preciso um olhar mais clínico, na ocasião tivemos de maneira voluntária a presença de uma profissional de restauro aqui no museu com maquinário a laser, específico para detectar fungos”, afirma Lopes. O coordenador da Casa do Museu relata que todo o processo entre a retirada do congelador até o documento estar apto para ser separado e guardado novamente leva de 30 a 40 dias. Também é preciso levar em conta as condições climáticas externas, os dias precisam ser quentes e adequados para a manutenção e a restauração deste material, facilitando assim, a conclusão rápida do processo.
A importância da ajuda comunitária
O processo de restauração deve ser cuidadoso, além de demandar tempo, também exige muita paciência. A comunidade de Arroio do Meio desempenha um papel crucial nesse momento de recuperação. “Este é um patrimônio que pertence a todos, e a colaboração da comunidade é essencial para que possamos reconstruir o que não pode ser perdido”, destaca Lopes.
Neste sentido, a Casa do Museu está de portas abertas para receber voluntários que queiram contribuir com o processo de restauração, os moradores de Arroio do Meio que desejarem ajudar, devem ter disponibilidade e ter bastante paciência para com o manuseio dos documentos. “O museu vai disponibilizar os materiais de apoio e de restauração para os voluntários. Também iremos ministrar uma oficina de como deve ser feito este restauro”, comenta. O historiador Sérgio destaca ainda que, mais do que nunca, este pode ser um esforço comunitário. A união dos cidadãos será fundamental para preservar a história e garantir que as futuras gerações possam conhecer e aprender com o legado deixado por aqueles que vieram antes deles.
Na reserva técnica do museu, um ambiente com umidade relativa do ar controlada, estão os documentos que já passaram pelo processo de restauro e precisam de separação. Muitos outros documentos que foram afetados ainda estão congelados, ali encontra-se de tudo: atas; ficha ponto de professores, ex-professores e funcionários das escolas do município e de municípios que já se emanciparam de Arroio do Meio; históricos escolares de estudantes; fichas de inscrições; cadastros; matrículas; relatórios; entre outros.
Foto: Liniker Duarte