Quando deixou para trás Forquetinha, em 2009, e encontrou trabalho em Arroio do Meio, Ana Paula Grunewaldt Guterres, então com 17 anos, não imaginou que em determinados momentos, ao invés de pedras, encontraria tanta água pelo caminho. Ou melhor, inundações.
Nos primeiros quinze anos trabalhou em estabelecimentos do ramo alimentício/confeiteiro, Maomé (hoje Tudesca), posteriormente na Padaria Pão Fresquinho e por último na Panificadora Pedrotti. Aprendeu e compartilhou experiências, conquistou amigos e clientes.
Em 2019 decidiu que era hora de empreender. Assim surgiu a Padaria Maná. Alugou uma casa, na rua Dr. João Carlos Machado, no bairro Navegantes. Transformou sala e cozinha em padaria e passou a residir, com o marido Anderson e o filho Pedro, na garagem. Juntos viram o empreendimento prosperar. Agregaram novos produtos e Ana, colocando em prática novas receitas, logo formou uma clientela considerável.
Em 2020 o cenário era promissor. Ninguém esperava uma enchente, porém ela veio e invadiu o empreendimento, deixando um rastro de destruição.
Foi preciso recomeçar em meio ao caos e mergulhando de cabeça no youtube e internet. Pesquisando e assistindo vídeos, Anderson aprendeu a consertar as máquinas da padaria. Após a cheia, o imóvel que já não era adequado ficou bastante comprometido. Decidiram procurar outro local nas proximidades, visto que o bairro, na época, era populoso.
No novo espaço, localizado na rua Campos Sales, também no bairro Navegantes, o ambiente maior permitiu expor melhor os produtos. Foi necessário comprar mais equipamentos, contratar ajudante, foi incorporada uma cafeteria, ambiente climatizado. Tudo ia muito bem afinal, planos e sonhos fazem parte da vida de quem trabalha e tem responsabilidade, ainda que seja preciso acordar diariamente às 3h30min para garantir o pão na mesa das famílias. Então chegou setembro de 2023 e com ele, uma nova enchente, bem maior que a anterior.
As perdas foram gigantescas. Saíram apenas com a roupa do corpo, o restante foi levado pelo rio Taquari. Seu curso normal passava nos fundos do terreno no qual estava instalada a padaria (hoje o prédio não existe mais, pois foi completamente destruído na enchente de maio/2024).
Foram acolhidos por familiares que ainda residem em Conventos. Naqueles dias, o irmão Vanderlei deslocou-se a Arroio do Meio com um caminhão e uma caravana de amigos, colegas de trabalho e trilheiros, tirando do local tudo o que encontraram (mesas, prateleiras e estoque foram levados pela água) e que poderia, de alguma forma, ser reaproveitado.
Com apoio da família, amigos e pessoas que não conhecia, recebeu doações de roupas, utensílios para a padaria e ajuda financeira. Sentiu-se encorajada a reabrir, agora em Conventos, Lajeado. Permaneceu por seis meses e frequentemente deslocava-se a Arroio do Meio onde continuou atendendo clientes fidelizados. Para ajudar nesta retomada, o marido buscou trabalho na construção civil.
A enchente e as perdas podem ter tirado um pouco da alegria. Deixaram marcas, mas não perdeu a fé em Deus. Num momento de indefinição, pensou em encerrar as atividades. Não via possibilidades de reverter a situação, mas sentiu-se chamada a voltar para Arroio do Meio. Ao passar pela rua Antônio Fornari, no bairro Bela Vista, avistou uma sala vaga num prédio comercial, o local era perfeito.
Em março de 2024 a Padaria Maná estava de volta a Arroio do Meio. Sentiu-se abraçada pelo bairro, também populoso, e ali, longe do rio, acreditou que a água nunca chegaria. As enchentes, definitivamente, ficaram no passado.
Mas o rio veio em menos de dois meses. A enchente de maio de 2024 surpreendeu o ‘’mundo’’ e, novamente, invadiu o estabelecimento de Ana. ‘’Desta vez tiramos alguns balcões, erguemos o que conseguimos e não tendo onde colocar o restante, foi preciso deixar tudo até porque o próprio bairro foi duramente atingido. Não havia lugar para colocar mais nada’’, lembra, um tanto quanto entristecida.
Sem perder a fé e ao mesmo tempo, sem saber o que fazer, por 30 dias permaneceu junto às máquinas, na companhia do marido e filho Pedro (16), numa garagem cedida no bairro Aimoré. Decidida a dar baixa na empresa, buscou trabalho na indústria calçadista, mas rendeu-se ao carinho e ao pedido dos clientes e amigos que formou ali, querendo que voltasse.
Em mais esta retomada, o marido consertou as máquinas, fornecedores bonificaram com mercadorias, amigos e clientes ajudaram de todas as formas possíveis. O grupo de Chapecó com muitas máquinas, caminhões e pessoas, permaneceu mais de uma semana em Arroio do Meio, auxiliando na limpeza da cidade, e ajudaram Ana Paula no transporte do maquinário, bastante pesado, do bairro Aimoré para o bairro Bela Vista. Assim, a Padaria Maná reabriu outra vez.
A fé em Deus em momento algum foi abalada. A bondade de tantas pessoas fez com que a empreendedora Ana Paula vislumbrasse dias melhores, sem pedras, sem mais inundações pelo caminho.
Não é à toa que o nome da padaria é ‘MANÁ’, alimento miraculoso que Deus forneceu aos israelitas no deserto do Êxodo, uma forma de pão do céu, que sustentou o povo em sua jornada, o ‘pão da vida.’
