É difícil resistir ao pedido do filho para ganhar um cachorro. A afetividade, a companhia e a natural simpatia pelo bicho levam fatalmente à aquisição. Depois da euforia inicial, sobra para os pais o passeio diário, o banho e tosa, vacinas e toda a manutenção. Depois de 23 anos de reiteradas negativas, cedi. Resultado: o maltês Fiuk é o dono da casa. Meus filhos, de 19 e 21 anos, trabalham, estudam e estão sempre exaustos.
Ceder aos apelos candentes dos filhos é desafiador. Há dúvidas entre permitir versus o temor da permissividade incondicional. Nutrimos a certeza de que os conhecemos. Foram centenas de madrugadas insones por cólicas e febre. Por meses fomos os únicos a compreender o “dialeto” das primeiras palavras, grunhidos e expressão numa comunicação incompreensível para os mortais comuns.
A infância, antes desafiadora, soa como brincadeira com a chegada da adolescência, fase recheada de alterações físicas, nuances emocionais que parecem uma montanha russa. Sem falar das tentações que se esgueiram através do smartphone. Ali, tudo é exibido, compartilhado, opinado/criticado e deletado. Sumindo num passe de mágica.
Um pacto de confiança é fundamental para firmar uma parceria com os filhos
Logo querem aprender a dirigir. Com a CNH na mão, novos temores nos invadem nas saídas noturnas, tortura interminável que novamente nos tira o sono. E aqui não se trata de uma força de expressão. O ruído da chave girando na maçaneta nos primeiros raios de sol varando a persiana é o alívio final. Mais uma madrugada superada. Desta vez, sem cólicas. Mas com os inúmeros temores da violência, do álcool, das drogas, do trânsito.
Pais são submetidos a torturas intermináveis na educação dos filhos. Ensinar a falar a verdade parecia óbvio antigamente, mas hoje isso se mostra temerário. Afinal, temos um mundo onde grassa o egoísmo, a falta de escrúpulos e o déficit de solidariedade.
No ambiente familiar os filhos agem de maneira diferente daquela adotada quando estão entre amigos. A influência do grupo muitas vezes contamina os valores que procuramos incutir por décadas. É nestes momentos que a tememos que tudo tenha sido em vão.
Esquecer a chave de casa, faltar dinheiro antes do final do mês, terminar a bateria do celular justamente quando nós queremos falar com eles, omitir detalhes sobre viagens no feriadão e manipular informações são comportamentos comuns em todas as famílias.
Firmar um pacto tácito de confiança mútua, permeado pela amizade e a certeza de apoio presente pode ser um antídoto eficiente. Somente o amor incondicional garante que, depois dos deslizes comuns, os filhos continuem nossos amigos. Esta cumplicidade é garantia de segurança.

