Choveu como poucas vezes havia visto em Porto Alegre. Água a transformar ruas em rios sujos, carregando o relaxamento dos cidadãos que sempre reclamam dos serviços públicos e pouco fazem por sua cidade. Bueiros e bocas-de-lobo vomitavam pedaços de cadeiras, ratos vivos, e dezenas de quinquilharias jogadas fora. Pior, motoristas ansiosos, mal-educados, ensopavam dezenas de pessoas com essas águas. Cenas lamentáveis! Ilhado a duas quadras de meu escritório, na manhã de quarta-feira, desisti da experiência náutica e, de dentro do meu carro, esperei por cerca de uma hora o movimento angustiado das pessoas.
Em uma esquina, acompanhei uma cena interessante. Um rapaz correu para a marquise, ligou imediatamente o telefone, a água apertava o cerco, com a calçada transformada em piscina. Ali, havia outra pessoa. Uma jovem também. Encharcada dos pés a cabeça. Nem se olharam. Ambos estavam atentos aos telefones móveis. Conectados, certamente, nas redes sociais. Ele fotografou meu carro, inclusive e vi que distribuía a imagem para seu grupo de amigos. No mundo virtual passamos a ter muitos amigos e seguidores. Coisa fina!
O tempo foi passando, a chuva cedeu, mas as poças permaneciam irredutíveis. Pouco antes de eu retomar meu caminho, vi que o jovem olhou para a moça com mais atenção. Analisou-a de cima abaixo e fixou-se no rosto, realmente bonito. Ela percebeu, ficou meio sem jeito. Mas não se animava a sair dali. O jovem voltou ao celular e tanto botão apertou que achou o que buscava. Abri o vidro, abaixei o volume do rádio, para ouvir o que ele diria a ela. Mas voltou ao celular e digitou alguma coisa. Ela riu. Ele também. Eram “amigos” na rede social, mas não se conheciam. Um sabia da existência do outro através de uma ou outra frase curta. E precisou o céu desabar para se conhecerem no mundo real.
Eu gosto de coisas como Facebook, ou um blog, onde as ideias podem ser trabalhadas e você conquistar “seguidores” como em uma seita cibernética maluca. Eu “curto” você “curte”. Mas nada substitui o contato natural, olho no olho. Ele estendeu a mão, saíram aos pulos entre as poças e ainda me acenaram. Éramos parceiros no infortúnio. E quem sabe daquele encontro não role um namoro. Ou pelo menos uma lição sobre o que realmente significa amizade, ou a disposição de seguir alguém. Estaremos sendo guiados, por gente imaginária, tipos os amigos imaginários da primeira infância. Cone¬xões via satélite: deixamos para nos ajudar a encontrar a festa, ou o trabalho, com os mapas online e GPS serviços úteis que nos ajudam quando decidimos “Sair para ver gente!”