Dona Inês desviou os olhos da televisão que, mostrava mais uma matéria sobre a morte da soldado Fabiana Aparecida de Souza, 30 anos, em ataque a sede da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) do Morro do Alemão, no Rio de Janeiro. Ela estava revoltada com o contra-senso – se aquele era um lugar voltado à negociação pela paz, por que o atentado? E reclamou das UPPs: “são uma fantasia, no mínimo um acordo entre bandidos e autoridades. E com bandido não se faz negócio”. Estava ali, em um fatal disparo de fuzil, que perfurou o colete à prova de balas, uma prova de suas palavras.
Mais indignada ficou ainda Dona Inês, ao saber que a morte da soldado pode ter sido motivada pelo sequestro da mulher de um traficando por policiais militares, criminosos, é claro. “Para onde iremos todos nós?” bradou ameaçando com o aspirador de pó em punho. Lembrou que agradecia por estar morando em um lugar mais tranquilo, junto ao neto e o marido. Ela sabe muito bem o que é a vida em lugares dominados pelo tráfico. Tem um filho preso e saiu da vila onde morava porque estavam “jurados de morte”. Hoje vive em paz e lamenta que os governos não criem mais opções de educação para os jovens.
Dona Inês tem dois filhos. O mais velho, fiscalizou mais e hoje está bem na vida, com emprego fixo e encaminhado. O outro, 6 anos mais novo, se criou mais solto. Ela trabalhava dia e noite, assim como o marido, pedreiro. Acabou vendo o caçula caindo na tentação das drogas que o ensinaram a mentir, a usar armas e levar, em sua aventura marginal, a paz de uma família que até então era apenas humilde, mas sem vínculos com o crime.
Consciente, ela sugere que os governos – agora que disputavam prefeituras e câmaras municipais – pensem em projetos simples, mas efetivos que garantam uma atenção à gurizada que fica solta na rua enquanto os pais estão na luta pela sobrevivência. Caso contrário, ela teme que todas as regiões deste imenso país sofrerão as consequências desta violência que joga até mesmo policiais nas garras do crime, provocando a morte de seus próprios colegas, tal qual suspeita-se ter acontecido agora com Fabiana Aparecida.
Paz não surge como por encanto, ou com uma simples bandeira branca. Vem com a disposição de realmente querer mudar e as mudanças só acontecem quando se oferece cultura e educação ao povo. Por enquanto só ensinam “coisa ruim”, lamenta ela. Terminou a faxina, dona Inês se foi e fiquei em casa, convicto que qualquer cidadão, não apenas os governos, pode dar sua contribuição neste caminho. Afinal, a maioria ainda é do bem, só está intimidada, querendo sumir, esconder-se, enquanto o momento é de salvar-se o futuro com os jovens do presente.