Para a psicóloga Maria Angélica Hartmann Gräff, a socialização é um processo complexo do desenvolvimento dos indivíduos que se inicia já no desejo do casal de ter um filho, ou seja, na implicação e no comprometimento de quem irá cuidar desse bebê, que será criança, adolescente e adulto. Implica o desenrolar de um processo de interação social entre a pessoa e a sociedade. Alguns autores, especialmente da área da sociologia e da psicologia comportamental, afirmam que esse processo tem início na primeira infância (socialização primária) e afirma-se na adolescência (socialização secundária), mas que continua ao longo da vida.
Maria Angélica entende que a família é a base, o começo, o primeiro agente socializador na vida de uma criança. É a partir dela que aprenderá as primeiras normas e regras da sociedade, bem como sobre as questões culturais e valores, história da família, culturas diferenciadas, enfim, aprenderá a ser um ser social, pensante, com direitos e deveres, podendo atuar de maneira íntegra e integral nos mais diversos setores sociais como a escola, grupo de amigos e futuramente no mercado de trabalho.
“A família deve ensinar e permitir que a criança assimile valores, normas, comportamentos e condutas adequadas ao grupo social em que está inserido, incluindo aqui respeitar as diferenças ( étnicas, religiosas, culturais, individuais, entre outras). Não existem normas ou manuais a serem seguidos para que a criança internalize esse conjunto de normas e regras e, sim, orientações de diversas áreas – psicologia, pedagogia, sociologia e filosofia, por exemplo. A ciência psicológica nos mostra não uma só corrente de pensamento e sim várias modalidades de entendimento do ser humano para que possamos melhor orientar e trabalhar com e para as pessoas.”
Segundo Maria Angélica, um dos questionamentos e objeto de estudo mais atuais são justamente as variantes que têm ocorrido no meio social como as mudanças familiares: mulheres que trabalham fora são mães, donas de casa e profissionais que contribuem na renda da família (logo não estão tão disponíveis para cuidar de seus filhos), novas organizações familiares, adoção de crianças por casais homossexuais, enfim, a sociedade se modifica e não podemos pensar que as “regras” sociais de outrora se perpetuarão.
Na escola
Um dos locais em que se reflete com muita intensidade e que muito frequentemente detecta algum tipo de desajuste ou de sofrimento com as crianças é a escola, instituição que exerce papel fundamental na socialização, mas que não é a responsável sozinha por isso, como infelizmente muitos pensam: “A família é quem deve ensinar comportamentos adequados de modo a harmonizar a convivência social, e a escola é um membro, um elo desse processo e talvez por esse fator, o local onde as ‘falhas’ familiares aparecem com maior intensidade”, defende a psicóloga.
Na escola a criança busca estabelecer laços e modos de conviver semelhantes ao que observa na família (muitas vezes copia fidedignamente) e atua conforme o que aprendeu e assimilou. Se esses comportamentos não forem adequados às normas de convivência da escola, a criança pode reagir com agressividade, desatenção, submissão e consequentes problemas de aprendizagem, enfim, muitos são os problemas que podem surgir desse desencontro entre as formas de conviver da família e da escola. Outro fator que resulta disso, segundo Maria Angélica, é que muitas vezes a escola não sabe muito bem como lidar com determinados desajustes na socialização e parte para a ação buscando justificativas, rótulos, ou seja, busca um diagnóstico para justificar o comportamento da criança e a sua impotência para agir diante do problema de conduta ou de aprendizagem. Novamente aí o diálogo entre escola e família se faz necessário, bem como o auxílio de um profissional da área da psicologia ou psicopedagia para auxiliar no manejo. À escola, cabe o papel da transmissão dos conhecimentos científicos (socialização formal), o desenvolvimento de capacidades cognitivas, afetivas, de relacionamento em sociedade, potencializar competências comunicativas e participando ativamente na formação da identidade individual de cada aluno (socialização informal), já que está todos os dias em contato direto e influencia sim na formação de cada um dos seus alunos.
Uma maior influência da sociedade
Atualmente, as crianças já ficam aos cuidados de escolas a partir dos quatro meses de idade, o que significa uma aceleração no processo de socialização e uma maior influencia da sociedade na formação das crianças. Por isso, os pais sempre devem estar atentos aos seus filhos, trazendo para si as suas responsabilidades de educar, ensinar valores morais e éticos, já que lá fora encontrarão crianças que têm essa formação em casa e crianças que não têm. Logo, os valores da família devem estar muito bem arraigados e assimilados pela criança para que ela possa ser influenciada, sim, mas pelas coisas positivas, que venham somar no seu crescimento e, em contrapartida auxiliar colegas e professores no crescimento do coletivo.
A partir destas reflexões podemos compreender a importância que a família e a escola têm como pilares para a formação da identidade e personalidade do indivíduo bem como transmissores dos princípios éticos e morais que permeiam a sociedade como um todo.
Por isso Maria Angélica orienta que as famílias nunca abram mão de seus filhos, não deleguem a ninguém o que é de direito e dever tanto dos pais quanto dos filhos, de permanecerem, se identificarem e crescerem no seio de sua família (quando isso é possível), de serem amados profundamente, e, em relação com a escola, busquem sempre o diálogo sadio em prol do crescimento, pois a socialização é resultado de uma boa integração entre valores subjetivos e objetivos.