“…Prá quê, que você foi se entregar
Se na verdade eu só queria Uma aventura
Porque você não pára de sonhar
É um desejo e nada mais…” (Prêntice, Ed Wilson, Paulo Sérgio Valle) canta, José Augusto
É sempre assim, O começo é divertido, cheio de provocações. Depois percebem que a atração vai além dos gracejos bem humorados, desejam o toque macio. Epidérmico. De repente, tudo em volta que andava meio opaco, ganha luz, vida e aromas especiais. O sentimento bruto, que nasce de uma súbita disposição para a aventura, ocupa todos os espaços. Esquecem que são casados, noivos ou namorados a uma longa data.
A rotina passa a ganhar um sentido e o desejo, irrefreável, avança. Tanta fantasia, tanta lua cheia, tanta vontade de celebrar. Acordos se firmam secretamente, são uivos contidos entre ligações secretas, mensagens cifradas em redes sociais e encontros rápidos, tensos. Excitantes. Assinam documentos em branco, como se o prazer não cobrasse seu preço em entrelinhas nunca percebidas diante da nudez aos olhos.
Ambos têm sede e fome, vivem no deserto do tédio comum aos adultos bem sucedidos. Não pense que os ditos infelizes, casais maltratados pela vida sofrida, miserável em todos os sentidos são as maiores vítimas das tentações. Esses quando podem, libertam-se. Gente organizada, que mantém as contas em dia, toma remédio na hora certa, cuida da balança e faz dieta, frequenta academia é a que mais cansa desta coisa certinha. A satisfação vai além do previsível. Não é um contrato, um negócio. Na verdade, tem requisitos de fundamento inexato.
Quem nunca ficou compadecido da esposa dedicada que chega a casa extenuada e ainda prepara um assado especial? Quem sabe não estará ela cansada desta vida certinha? Do homem que nunca esquece uma data especial, que planeja viagens românticas a dois, festas legais entre amigos, mas ao mesmo tempo, é absolutamente previsível. E ficam os dois iguais a copeiros que tem a obrigação de polir os cristais que nunca serão seus, mas que se por ventura forem quebrados, pagarão caro por cacos. Quem vai querer em casa, os restos do que antes era um lindo enfeite?
Assim, ao surgir a possibilidade de uma fuga espontânea, que ventile a imaginação e os sentidos, abusam de tudo, lambuzam-se e nem percebem que o acordo firmado anteriormente – viver exclusivamente uma aventura – foi rasgado na refrega que os empurrava de encontro a cristaleira.
O prazer para um dos amantes sempre acaba antes e a sintonia inicial, vira uma espécie de coceira alérgica, pois a outra parte já fantasiava com uma comunhão de corpo e alma. Assim, embora a esposa sempre chegue na hora certa e nunca se permita queimar o assado, sempre existe o risco de uma lágrima furtiva salgar a janta. O outro – ele ou ela – já estará na segurança do lar, planejando as férias de inverno, enquanto serve ou é servido de mais uma fatia daquele mesmo assado.
Quem sabe, voltem a buscar uma nova aventura, “desta vez sem envolvimento afetivo mesmo!” O outono e frio passarão, a primavera com seus perfumes e cores, apagará as lembranças tristes e o verão, sempre permissivo, incentivará a paixão. Afinal, tudo não se resumiria mesmo a um desejo e nada mais, como previa a canção? Ah!… Os bobos de abril.