“Pai vai fazer um calor muito forte. Vamos para a praia, por favor!” Esse pedido, mais ou menos nessa ordem, foi o que eu ouvi de uma menina, na mesa ao lado, na sorveteria onde todos tentavam refrescar um pouco. Ah! Salve o ar refrigerado dos shopping centers! Mas o apelo, com olhinhos suplicantes, não mexeu muito com a sensibilidade paterna. De repente chega a mãe, carregada de pacotes e dizendo que precisava muito de um suco de frutas, um sorvete com cobertura de chocolate. E a praia? “Esquece filha. A estrada está um horror. Vamos para o clube”, respondeu o pai.
Eu voltei ao meu café expresso duplo e dei graças por ter uma singela piscina em casa. Aliás, doada por moradores de condomínio em Lajeado que, por motivos bem aceitáveis, cansaram da manutenção dessas caixas de água imensa, onde, na verdade, passamos mais tempo faxinando do que, usufruindo. Mas eu gosto. É um exercício, uma forma de pegar um sol ao amanhecer, ou ao final da tarde.
Mas voltando à guria, entendi o que ela realmente queria. As suas amigas, as melhores, estavam no litoral. O importante não era a brisa, as ondas que neste ano estão com a força e a cor das praias nordestinas. O que valia mesmo todas aquelas longas horas na free way, era poder saber se “a Jamila havia conseguido ficar com aquele guri esquisitão”. Não quero bancar o fofoqueiro, mas eu conseguia ouvir tudo. “‘E a Laura? Ela estaria lá!” Haviam prometido levá-la à festa de uma nova amiga.
Foi aí que a mãe deu a cartada decisiva para mudar a carranca negativa do marido. O combinado seria a filha dormir na casa da amiga, com outras gurias e pai de uma delas já havia se comprometido a buscá-las em horário que já estava combinado. Ah! E uma prima mais velha as acompanharia evitando que fizessem qualquer bobagem como, por exemplo, consumir bebida alcoólica.
Mesmo assim, o marido ainda estava balançado, tentando manter o veto. Sem perder tempo, a esposa abriu uma sacola – aquela de famosa loja de roupa íntima – e mostrou as diminutas peças que havia adquirido no shopping. “Preciso de tua avaliação. Vai que não fiquem bem em mim”. E foi assim que, de uma hora para outra, alguma coisa se eriçou nele. O discurso aos poucos aliviou.
“As gurias ficarão seguras mesmo? Posso confiar?” Claro que sim, responde a esposa. E foi assim que, naquele sábado, as meninas ganharam uma noite de muita dança na boate. Em casa, imagino que se confirmou o tal desfile prometido e a diversão aconteceu a dois, ouvindo música no streaming. “Uma boate azul improvisada”, ouvi ela prometer, rindo muito. E quem iria condenar? Afinal, os papais e as mamães também têm direito a uma folguinha a sós, enquanto a filharada está na balada.