É velha – e verdadeira – a certeza de que uma amizade se mede pela intensidade e respeito mútuo, e não pela quantidade de encontros. Wanderley “Xumby” Theves e Cléa – nascida Meneghini, vizinha do bairro Bela Vista – são diletos amigos pelo jeito especial de cada um. Ele, um maluco-beleza, gozador, carismático, artista, um eterno guri. Da “Gringa” lembro da personalidade oposta: introvertida, zelosa pela família, amorosa e sempre gentil com todos.
Sou um “dinossauro” em relação aos avanços tecnológicos. Sequer tenho perfil no facebook. Minha única extravagância é o uso de uma ferramenta do GMail, uma “janelinha” que permite conversar on line. Dia destes fui chamado por um “invasor”, chamado Guilherme Theves. Descobri depois que se tratava do filho do Xumby e da Cléa. Eles, juntamente com Cissa – a filha da dupla – enfrentavam uma batalha inglória contra uma doença rara.
Guilherme – ou simplesmente Gui, como era carinhosamente chamado – fez de seu notebook instrumento para se comunicar com o mundo. E eu, por algum motivo divino, fui escolhido para compartilhar de suas ideias e pensamentos. Limitados em seus movimentos, sem caminhar ou sequer falar, Gui foi direto em seu último contato comigo:
– Nico! Estou com muitas dificuldades para digitar. Estou piorando e esta doença de m… quer me derrotar, mas vou brigar até o final! Não enfrentei tudo isso pra terminar deste jeito. Desculpe pelos erros de digitação, mas tá brabo escrever. Abração e até breve! – escreveu o amigo com quem jamais falei pessoalmente.
Guilherme jamais reclamou, jamais desistiu e fez de sua família um exemplo de amor incondicional
Dia 22, quinta-feira, recebi uma ligação informando que Guilherme partira para o céu. Entre nós ficaram os três anjos que fizeram de tudo para mantê-lo entre nós. Xumby, Cléa e Cissa renunciaram às suas vidas, sonhos e projetos. Fizeram da recuperação de Guilherme uma obsessão. Esta semana recebi do empresário Vitor Kalsing cópia do comentário postado por Cissa no facebook. Li e reli várias vezes, chorei pelo realismo, sensibilidade e doçura das palavras.
A demora na descoberta da Doença de Wilson dificultou a cura. A enfermidade – rara, complicada e devastadora para pacientes e familiares – foi incapaz de levar Gui a reclamar da vida.
“Sabe o que era mais admirável nisso tudo: Em 8 anos e meio de tratamento e totalmente dependente dos outros, o Gui nunca reclamou. Nunca ouvi uma reclamação e muitos menos um ‘eu desisto’. Ele simplesmente erguia a cabeça e seguia adiante, mesmo com tantas frustrações e tentativas sem sucesso. Ele dizia que a música ‘Tente outra vez’, de Raul Seixas era o seu hino durante essa trajetória.”, escreveu a irmã Cissa.
Meu profundo respeito e admiração à família enlutada. O amor incondicional de vocês é um exemplo, uma lição de amor que doença alguma atinge! Um beijo no coração de todos.