Há muitos anos afirmou que a arrogância disfarçada de orgulho provoca estragos irreparáveis ao nosso amado Rio Grande do Sul. Por décadas debochamos do Nordeste pela maneira de falar, pela pobreza, pela preguiça. Também com desdém tratamos os vizinhos catarinenses, dizendo que somente suas praias mereciam atenção. O Rio de Janeiro, para nós, não passa de uma praia famosa por suas mulatas, bossa nova, Carnaval e futebol.
Indicadores gaúchos em diversos segmentos são lamentáveis. Em alguns casos são até vergonhosos. Na agricultura fomos o “celeiro do Brasil”, mas ficamos à mercê de repetidas estiagens sem a competência para desenvolver projetos de irrigação viáveis para pequenos e médios produtores.
Muitos conterrâneos agem como tantos pais que preferem mimar os filhos ao invés de cobrar atitude. Observam seus erros, mas fecham os olhos. Paralelamente as críticas externas são encaradas como “inveja de gente despeitada que não teve o privilégio de nascer na Província de São Pedro”.
A postura é insana porque internamente nosso Estado é um festival de críticas, acusações mútuas e ciúmes. Este comportamento me levou a cunhar a expressão “caranguchos” para definir a estranha mescla de caranguejos com gaúchos que habita o extremo sul do Brasil.
Conciliação não é um hábito entre os gaúchos. Basta conferir o volume de processos judiciais
Caranguejos são crustáceos que, encerrados num cesto após a captura, insistem em impedir os colegas que tentam fugir do cativeiro por serem puxados pelos companheiros invejosos. Por mais meritório que seja uma iniciativa, aqui, no Rio Grande se costuma perguntar primeiro “quem” é o autor para somente depois emitir uma opinião, quase sempre tendenciosa e condenatória.
É desnecessário falar de setores como a educação e a segurança. Não sou ingênuo para acreditar que somente o pagamento de remunerações decentes é capaz de melhorar a situação, mas trata-se do primeiro passo. Isso, no entanto, é uma cantilena, uma espécie de fundo musical a embalar as campanhas eleitorais a cada dois anos. Ao lado da saúde – e do emprego – compõem o slogan que perdeu força pela repetição e descumprimento.
Na política nota-se que basta um candidato atingir o percentual irreversível de votos para assegurar o mandato para tornar-se alvo de uma oposição sistemática. Independentemente de partido ou ideologia (isto ainda existe?). A crítica constante, a dificuldade em conviver com os “diferentes” e a resistência ao diálogo com os contrários é uma chaga já arraigada. Lamentavelmente os nossos históricos prejuízos são incapazes de sensibilizar os gaudérios, especialistas no enfrentamento.
O Rio Grande é um dos estados onde se registra os mais tímidos índices de conciliação judiciais. Em compensação na Justiça estadual (ou seja, sem contar as Justiças Eleitoral, Trabalhista, Federal e Militar) tramitam mais de 4 milhões de processos. Isso diz tudo.