E lá estava o velho eucalipto no Parque da Redenção, em Porto Alegre. Imponente, majestoso, até desabar sobre três pessoas que faziam sua caminhada habitual, ou simplesmente curtiam o verde que resiste ao concreto da cidade grande. Não vou aqui iniciar um tratado sobre a podridão que o devorava por dentro, não sou botânico. Mas a metáfora das aparências é irresistível. As cenas que assistimos no cotidiano onde as estampas – macias, bonitas e fofas – se consomem em uma feiura e aspereza interior que pode levar a grandes e surpreendentes tombos.
Apaixonado por fotografia, muitas vezes registrei eventos, casamentos, batizados e festas de amigos. Na maioria das vezes era contratado para trabalhos diferenciados, utilizando filmes e filtros, em cenas inusitadas. Hoje é comum, esse tipo de coisa, mas nos anos 70 eu conseguia um dinheiro extra e ainda me divertia. Ou tomava sustos. Foi mais ou menos assim, na vez em que fotografei uma noiva linda, morena de olhos verdes. Guria muito séria, frequentadora de Igreja. Ela e o noivo.
Tão envolvida estava com a ideia de fotografar o cotidiano, das aulas na faculdade até o curso de noivos que, numa dessas sessões fotográficas esqueceu que eu estava ali para registrar tudo. Minutos depois da foto em uma antiga loja de discos da Capital – um beijo tipo “selinho” no noivo, este sempre com pressa para voltar ao escritório, beijou apaixonadamente um cara que eu não conhecia, em plena Rua da Praia. Quando ela se deu conta que eu estava ali e havia registrado tudo, implorou: “Ele é só um antigo amigo. Foi uma brincadeira”, jurou.
É claro que joguei fora os negativos que a incriminariam. E ainda por cima, no dia do casamento, caprichei em outras fotos alternativas não comprometedoras onde o véu branco, símbolo de virginal pureza, contrastava com um sorriso enigmático. Soube que a relação durou exatamente um ano. O marido não precisou de minhas fotos para descobrir o óbvio. A árvore que haviam plantado crescia bonita, mas por dentro, a hipocrisia envenenava as boas intenções e não permitia dar corpo e força às raízes. Tornava-se casca e folhas… Nem precisou de vento para cair.
Certa vez, ao ler Adam Phillips, um psicanalista inglês, lembro que ele dizia que exigir monogamia aos casais era mais do que uma mentira, uma pressão para um ser tudo para o outro. “É uma demanda moral irrealista”, ponderava. Mas igualmente alertava que as pessoas não estão preparadas para a infidelidade. Que sinuca, hein? Em síntese, todos querem ser felizes. E para isso escolhem casamentos e profissões, muitas vezes só pela projeção social a ser desfrutada. E o próprio psicanalista aconselhava: “Há coisas muito mais importantes do que a felicidade: justiça, generosidade, gentileza.” Virtudes que, somadas, ajudam a manter a árvore da vida frondosa por muitos anos, com certeza.