Ter pais vivos até idade avançada é um privilégio. Meu pai morreu aos 52 anos, fulminado por um enfarte em Tramandaí, pouco depois de chegar de uma pescaria com minha mãe. Foi um impacto tão profundo que até hoje não absorvi o golpe. Já era adulto, mas as lições que recebemos dos pais são permanentes.
Vejo a relação pai-filho permeada por três momentos básicos. No primeiro o pai é super-herói, capaz de livrar a prole de todos os perigos porque ele é invencível. No segundo, quando chegamos à adolescência, ele nos parece superado, um ranzinza incurável, preso a tradições ultrapassadas. Os conflitos parecem insuperáveis.
A idade adulta, todavia, é de águas mansas. Compreendemos as adversidades enfrentadas pelo patriarca que, com dedicação férrea, venceu as agruras para sustentar a família, dar estudo e ensinar valores. Foi nesta quadra da vida que a morte bateu à minha porta. Perto da aposentadoria, o velho Giba acalentava tantos projetos que não haveria espaço para o ócio.
Pintar telas – ele era um grande desenhista/letrista! -, diversificar a granja de suínos fundada com o amigo Paulo Steiner em São Caetano, tirar brevê para voltar a voar e morar no litoral nos meses frios eram planos alinhavados há anos. Inquieto, curioso, persistente, ensinou que o trabalho é fonte de conquistas e de consolidação dos valores herdados.
Quando ele partiu eu trabalhava no jornal Zero Hora. De volta do luto, o amigo Ruy Carlos Ostermann me consolou:
– Não importa nossa idade. Somos todos órgãos!
Usufruir de momentos de confraternização é o lado compensador da vida. Basta abrir os olhos para descobrir pessoas que nos alegrem
Isso é verdade absoluta. Talvez os filhos que perdem os pais em idade sofram menos porque possuem seus próprios filhos. Mas um imenso vazio se apossa daqueles que aprenderam a admirar, respeitar e cultuar quem ensinou os fundamentos da vida.
A morte, sempre, é um ato de violência. Não somos educados para lembrar que a partir do nascimento se inicia a contagem regressiva. Parece que adquirimos mais tempo, embora a realidade seja exatamente oposta porque estamos cada dia mais perto da despedida.
Usufruir de momentos de confraternização é o lado compensador da vida. Reunir amigos e familiares constitui um exercício permanente de celebração. O consumismo exacerbado, somado ao individualismo estimulado pela insegurança por vezes refreia a vontade de conviver com aqueles que alegram nosso coração.
Se impõe, por isso, reagir ao conformismo, resistir ao pessimismo. Se cultiva o hábito condenável de almejar sem medida, ignorando o que a vida já nos deu, as conquistas obtidas, o tanto que outros sequer ousam um dia ter. No plano afetivo ocorre o mesmo. Dispomos de pessoas incríveis ao nosso lado. Basta abrir os olhos a nossa existência valer a pena!
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