O céu pintava o dia de um azul forte, vivo. “Primavera tem graça assim”, pensou ela enquanto observava a calma
da rua. Feriado é sempre assim! As pessoas somem em sítios, hotéis, casas de parentes. Viajam para uma saudável
troca de ares. Morava só. Viúva, que ultrapassara a fase da depressão e da revolta, mas, mesmo assim, nestes dias, sofria de uma leve sensação de vazio. O sol aberto lhe ajudava a não pensar em coisas ruins. Imaginou em aproveitar algumas de suas economias e, no próximo feriadão, viajar para qualquer lugar. Nordeste, ou quem sabe os países vizinhos.
Dançar tango! Nunca foi boa dançarina, mas com o marido arrasava nos bailes de antigamente. “É isso! Vou revolucionar.
Viajar mais!” O toque insistente do celular a tirou dos pensamentos e, como sempre acontece, levou mais tempo para achar a tal teclinha verde para atender. Retornou a ligação e, do outro lado da linha, uma antiga colega de escola, amiga de longa data a convidava para um piquenique. “Como assim? Isso é coisa que não se faz mais”, argumentou. A insistência foi tanta, o dia era tão especial em luz e temperatura, que aceitou.
Em questão de algumas horas já tinha preparado um bolo, sanduíches com pão caseiro e incluído até uma garrafa
de vinho. “Faz bem para o coração, ora!” Ao chegar, viu que a mesa de cimento da praça já estava decorada com uma toalha bem colorida. Contou oito vovós, quatro vovôs e jovens que deveriam ser netos ou sobrinhos. E brincou com a turma: “Não seria bom deixar uma ambulância de prontidão? Afinal, a terceira idade tomou conta do espaço.” Não foi necessário, o bom humor, o clima saudável e os quitutes, mesmo os pastéis fritos que uma das amigas levara, não provocariam danos à saúde de ninguém. Voltou para casa feliz, embora cansada.
Percebeu que importante mesmo é cultivar amizades. Fugir da monotonia.
Solidão é escolha. O certo é que somos seres sociais. E companhia é o que não nos falta. Se a família está longe,
tem lá seus planos e você, por este ou aquele motivo, não foi incluído, é bom manter a agenda próxima. Sempre tem
outro alguém em situação semelhante. Mais tarde, esta minha amiga, ficou sabendo que a responsável pela organização
daquele encontro na praça, enfrentara durante anos a depressão após o falecimento do marido.
Saiu da tristeza justamente ao redescobrir antigos parceiros. Todos, com raras exceções, adoraram esses encontros.
Tanta coisa para relembrar, tantos eventos para agendar. Uma pesquisa do Laboratório de Neurociência Social, do
departamento de Psicologia da Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, mostrou justamente que essas enfermidades
se previnem com um círculo de amizades. Não, não é necessário milhares de seguidores nas redes sociais, ou ser a pessoa mais popular do bairro. Um ou dois parceiros, já bastam.
“Eu me viro muito bem sozinha. Tenho livros e televisão para me distrair. Hoje em dia, tudo é feito para facilitar a vida dos solitários. Comida congelada, tele-entrega. Mas nada substituiu o contato com gente. Velhos ou novos amigos”
assegura a personagem desta crônica. Então, deixemos de ser ranzinzas, ou sejamos ranzinzas juntos! É muito melhor,
oxigena o cérebro, movimenta o corpo e nos torna mais simpáticos.
Pensem nisso neste feriado.