As enxurradas dos últimos dias, emolduradas por raios e trovões, trouxe à lembrança os meses de setembro da minha infância. Morava no bairro Bela Vista, onde nasci, e depois estudei na Escola Luterana São Paulo e no Colégio São Miguel. Setembro ficou marcado na memória porque no dia 29 se comemora o Dia de São Miguel, conhecido pelas enchentes.
Já contei aqui neste espaço que meu falecido pai, Gilberto Delmar Jasper, tinha o hábito de visitar os bairros alagados da cidade depois do almoço e antes da sesta, ritual sagrado. Tudo isso me veio à mente ao vislumbrar a imagem de casas invadidas pela água em diversas regiões gaúchas, inclusive em Lajeado e Estrela.
As enchentes são castigos injustos impingidos às populações carentes. A falta de planejamento urbano para impedir construções junto às zonas ribeirinhas resulta da omissão de autoridades. Pode desumano, mas proibir imóveis à beira de rios e arroios se impõe. A manutenção da situação atual coloca milhões de vidas em risco e arrastam recursos que deveriam ser usados na implantação de núcleos populares.
Aldo Thomé, um ídolo inesquecível que pregava o respeito às mulheres
Como morador da Bela Vista, perdi muitos dias de aula em agosto/setembro. Junto ao trevo de acesso à cidade, funcionava o estabelecimento de Oscar Barden e havia um açude, cujas águas cobriam a estrada de terra que ligava devido às chuvas ininterruptas. A alegria por não ir ao colégio terminou quando meu pai contratou um caíco para atravessar as águas. Depois da transposição, íamos a pé até o Colégio São Miguel para ter aulas…
Também nos dias de chuva, já adolescentes, tínhamos aulas “informais” de educação sexual, ministradas pelo inesquecível ídolo e amigo Aldo Thomé, professor de Educação Física, no salão do São Miguel. Com voz baixa e pausada, ensinava a agir com respeito, discrição e cuidados com as meninas, principalmente na hora das “músicas lentas” nas reuniões dançantes.
– Respeita a menina. Se tu não quer namorar, cai fora, não ilude a guria. Jamais desrespeita uma mulher! Homem de verdade é gentil, educado e não sai contando detalhes íntimos numa mesa de bar – repetia. Vendo as cenas da “vida moderna”, constato que o respeito jamais deveria sair de moda. Mas são outros tempos. É a era do exibicionismo, do consumismo e da cultura do descartável. Pelo que se vê, os princípios que norteavam a vida de cinquentões como eu já foram descartados.