Acho que eu não tinha nem 14 anos quando li “O Muro”, do francês Jean-Paul Sartre. Cinco contos devastadores a partir do primeiro, que dá título ao livro, sobre três homens capturados por militares fascistas que aguardam a hora do fuzilamento. Eu, menino de família classe média, acompanhava a revolução dos anos 60 embalado em canções, atitudes libertárias do estilo hippie e, de repente, os textos pesados, de relatos de gente em conflito, presa em seus arraigados preconceitos, me deixaram em choque. Existia esse mundo vazio e egoísta?
Levou algum tempo para digerir aqueles conceitos, na época eu tinha uma banda de rock que para sorte de todos não prosperou e, inspirado em Sartre, escrevi versos pessimistas que reclamavam de uma “multidão fantasiada de gente que se possui inconscientemente ao cruzar-se nas esquinas”. Foi um sucesso entre a turma de amigos, ficamos em segundo lugar em um festival de música e a breve e repentina fama me permitiu uma avaliação mais objetiva dos conceitos de Sartre.
Encarei aqueles contos como um panfleto literário sobre o muro que precisamos enfrentar, ou melhor, evitar como “el paredón” onde são fuzilados os grandes projetos, ou as iniciativas mais pueris, geralmente esmagadas em personagens que criamos para escapar da realidade. Não aderi ao existencialismo, mas tomei para mim a decisão de mudar a frieza calculada e previsível de muitos personagens do escritor.
Foi assim, sem psicanálise, mas como a coragem que arrancava das palavras de muitos bons autores que superei a depressão, o medo e as previsões pouco otimistas que fazia de mim mesmo, por ser fã de música, literatura e preferir natação, em detrimento ao futebol.
Eu não pretendia ser igual ou diferente, queria apenas um pouco de originalidade para enfrentar a vida. E assim o fiz, lutei contra o tédio de uma vida previsível, arrisquei com suor nas mãos, mas motivado pelo esforço de fugir daqueles personagens torpes.
Assumir a angústia existencial, na verdade, é libertador. A ansiedade das pequenas mudanças, dos desafios do cotidiano é que nos libertam. O menino acomodado, que conformava-se com suas dificuldades com as ciências exatas, aprendeu que a tensão daquelas aulas eram o que realmente o libertariam. Fugir me empurraria à condição dos personagens absolutamente mornos e de caráter frágil expostos por Sartre.
Objetivamente, não estou a incentivar a leitura de autores existencialistas, mas sim, de bons livros, impressos ou digitais, que levam a alguma reflexão. Textos das mais variadas escolas literárias, para que tenhamos argumentos contra os que nos empurram a conceitos medianos ou nos subjugam a dogmas genéricos. Somos humanos, somos humanidade, acima de tudo. E ler ainda é libertador.

