No mundo de tantas tentações, o esforço de pais e mães é fazer da família uma espécie de ilha. O principal objetivo é proteger os integrantes, de forma especial, os filhos. A experiência mostra que este objetivo chega a um impasse de difícil resolução. Por que? Porque é no convívio com as pessoas que pensam de maneira diferente que crescemos.
No primeiro dia da pré-escola – a “escolinha” – se inicia o processo de adaptação à vida social da criança. É o momento de maior angústia para os pais que veem, pela primeira vez, o bem maior de suas vidas agindo sozinho, longe da eterna vigilância. Aos poucos, porém, os herdeiros – à primeira vista tão frágeis – se mostram desenvoltos, prontos para enfrentar o futuro, a partir do microcosmo da escola que serve de laboratório.
Ao longo dos anos, os cuidados se alteram. A adolescência é, talvez, o maior desafio porque o desenvolvimento da personalidade alcança a encruzilhada entre a infância e o início da fase adulta. Mudanças, transformações, novidades, tentações. Repito, com a experiência de dois filhos com 20 e 23 anos, que cada minuto investido quando são crianças rende lucros a partir dos 12, 13 anos.
Há estremecimentos, discussões, mas a parceria é um investimento contínuo
O fenômeno onipresente da internet, que leva para dentro de casa todo tipo de conteúdo, ampliou os perigos quase sempre distantes da vigilância dos pais. Envolvidos na rotina de trabalho, homens e mulheres se veem compelidos a confiar precocemente nos filhos. Muitas responsáveis, infelizmente, renunciam à condição de pais. Preferem delegar a professores, babás e empregados domésticos o papel único de pai e mãe.
A parceria firmada com os filhos é um itinerário marcado pela turbulência. Discussões são ingredientes permanentes, mas sempre com respeito à opinião contrária e de olho na hierarquia familiar. A sinceridade é pressuposto indispensável para trilhar o caminho da maturidade. Até a chegada à vida adulta são horas e horas de estremecimentos que parecem irreconciliáveis. Mas não são.
Até hoje não sossego enquanto não ouvir o barulho da chave na porta de casa. Com o advento do Uber as coisas melhoraram, graças ao compartilhamento de viagens com amigos. Outra coisa que não se alterou foi a mania de perguntar sobre itinerários, lugares frequentados, nome dos novos amigos e convite para que os apresente para degustar um churrasco ou tomar uma cerveja gelada comigo. O olho no olho é, ainda, o melhor preventivo para problemas mais graves.
Manter a “ilha familiar” e dar liberdade com limite não é uma tarefa fácil. E não termina nunca porque é eterna. Como eterna é o amor que investimos numa relação que é o nosso bem maior.