Andava eu pelo shopping e vislumbrei um jovem manuseando seu indefectível smartphone. Lembrei de meus tempos de piá. Naquela época, conversar por telefone era uma tarefa bem mais difícil e, por isso, mais cara e rara.
Recordo quando meus pais combinavam com os parentes o dia e a hora em que iriam ao centro telefônico para se falarem por telefone. Isto sempre acontecia à noite quando as ligações tinham tarifas mais acessíveis.
Estas ocasiões eram especiais, revestidas de um ar de solenidade. Morávamos no bairro Bela Vista, naquela época ligado à cidade por uma estrada de chão batido. Isto quer dizer que “ir na vila” era um momento especial. No começo da noite tomávamos banho para botar a roupa “domingueira”, a melhor, para o passeio até a “telefônica”.
Ao chegar na central, éramos “aconselhados” a nos comportar, sob pena de severa repreensão:
– Ninguém fala alto ou briga. Se comportem, senão… – ordenava meu pai com aquele vozeirão igual aos locutores da Rádio Independente.
Em seguida, ele ditava para a “centrista” o número do telefone e o nome da pessoa que atenderia do outro lado da linha, geralmente parentes de Porto Alegre ou Lajeado.
Telefone era um aparelho mágico de uso exclusivo dos adultos
Na central telefônica sempre havia muitas pessoas. O local tinha piso e paredes de madeira que rangiam quando alguém caminhava. Lembro quando o centro telefônico funcionava na rua Visconde do Rio Branco, perto do escritório do advogado João Casotti. A espera era feita em absoluto silêncio, à exceção dos adultos, que conversavam entre si.
Assim que o nome do seu Gilberto Jasper era chamado ocorria um grande em alvoroço, imediatamente rechaçado por meu pai que, com apenas um olhar, exigia silêncio.
Com ar solene ele se dirigia até a cabine telefônica com porta de vidro, onde havia uma mesinha com um telefone preto e pesado. Lembro que a centrista repetia:
– Alô, alô… Arroio do Meio, falando, falando…
Raramente nós, crianças, tínhamos oportunidade de falar com os parentes através daquele aparelho mágico que nos transportava para bem longe dali. Era uma exclusividade reservada aos adultos.
Eram tempos difíceis onde as conversas substituíam as mensagens por celular. O rádio ocupava o lugar da tevê e os encontros entre familiares e amigos eram comuns. Atualmente a proliferação de ferramentas e plataformas de comunicação é infinita, mas parece que a depressão, a solidão e o egoísmo nunca estiveram tanto em alta.
Parece que nós, humanos, perdemos a capacidade de simplificar as coisas, ou de torná-las tão descartáveis que por vezes perdemos os verdadeiros amigos de vista.
– Deixa pra outro dia… se tivesse o número do WhatsApp dele, mandaria uma mensagem! – pensamos ao invés de correr em busca de velhos afetos que fizeram parte importante da nossa vida.