Em volta de uma mesa de bar, qualquer tema é pauta. Polêmicas são bem-vindas desde que respeitem as opiniões mais doidas e sejam regadas com bom humor. Nenhuma discussão deve poluir o ambiente com aquelas agressões verbais gratuitas, do tipo que invadem as demais mesas com uma irritante poluição sonora. Desaforos só os negociados, que atendam o perfil do grupo.
Mas o maior chato é com certeza aquele que discorda de todas as opiniões, simplesmente para virar a mesa. E num boteco que se preze, isso nunca funciona. Chato não tem assunto, tem verdades absolutas em temas como conflitos políticos, paixões, esportes ou música. Se eu sou Messi, ele é Cristiano Ronaldo ou qualquer outro. O que vale é a polêmica.
Num desses tantos feriados de abril, um amigo músico lembrou de um fã de sertanejo universitário, que atrapalhou um show de covers de bossa-nova que apresentava em um bar de São Paulo. Era a sua chance de mostrar seu talento de cantor e instrumentista. Levara meses preparando o repertório acústico, tipo banquinho e violão. Eram canções de Tom Jobim, Johnny Alf e outros que alguns acham chatos, outros adoram. Ele cantava para os que adoram. E ponto final!
Mas o sujeito queria ouvir Bruno e Marrone. “É musica boa, tu é um esnobe, tem preconceito”, resmungou o chato, enquanto o músico já estava louco par mandar o cara dormir na praça pensando na Paula Fernandes. Segurou até o momento em que o sujeito, totalmente sem noção, desafinou uma música da dupla Jorge e Matheus: “Despertador tocou, cadê o meu amor, Pra me dar o primeiro beijo do dia?
O músico, já saturado, soltou seu violão e correu à cozinha. Até o dono do bar assustou-se com a cena. Retornou com uma xícara de café preto que entregou direto nas mãos do mala. “Café, quem precisa de café”? E o músico, com a calma que João Gilberto, o maior cantor da bossa-nova nunca tivera respondeu:
“É para diminuir o efeito do álcool no teu sangue. Quem sabe tu me dê a chance de continuar com minhas canções que ensaiei à exaustão. Se não gostar, pega um táxi e vá em um bar sertanejo, que não falta aqui nesta cidade. Combinado? O silêncio foi interrompido por aplausos. O sujeito não tomou o café. Se acomodou em um canto, sob o olhar sério dos seguranças.
Mas como todo bom chato, algumas canções adiante pediu “Garota de Ipanema”. Não estava no repertório, mas meu amigo cantou. Afinal, era uma maneira de negociar a paz com o chato.
A noite se finalizou com mais aplausos, ele garantiu um contrato por mais alguns meses e me jura que pensa em uma versão bossa-nova de um clássico sertanejo. “vá que apareça outro por aqui”.
Com paciência, o bom humor havia contornado um problema que talvez, em outra circunstância teria acabado em bate-boca, ou coisa mais grave. E nem a bossa-nova ou o sertanejo universitário merecem um fim tão desafinado.

