Estava tudo quase perfeito. Lá fora, chuva. Dentro de casa, uma sequência de todas as séries possíveis de assistir em um dia de folga, convidavam ao sofá. De repente, no intervalo para esquentar a água do chimarrão, ela pergunta, sedutora: “Amorzinho, posso te fazer uma proposta? Tu não vai ficar chateado comigo?” E antes mesmo da resposta, vira-se para a parede da sala, aponta o imenso painel em óleo e sugere: “Vamos tirar daí? Dar para alguém, sei lá…”.
Sem tempo para a perplexidade, ele responde, no mesmo tom – direto e quem sabe, definitivo: “Não!” Imediatamente volta-se ao filme e seus personagens de encontros e desencontros. Olha pela janela, a chuva insistia forte e pensa “Vida a dois é isso”. As mulheres e suas mudanças de móveis, de pensamento. Achou melhor justificar a negativa, argumentando que a pintura fora uma encomenda especial, tinha valor sentimental.
Lembrou que ao iniciar o namoro, relatara toda a história daquele trabalho. E de outros detalhes artísticos que ocupavam as paredes da residência. Ela achara bacana. Tempos de espumantes onde tudo acabava em borbulhas e esquecimento.
Será que havia casado com uma fêmea alfa? Do tipo que lidera a relação? Ela, na maioria das vezes era quem sugeria roupas, passeios e até o tipo de comida e bebida nos jantares caseiros. No início, tudo era lindo. O cantinho onde residiam, aos olhos deles, parecia uma mansão. Não existe o feio na casa da paixão.
Mas aos poucos – e isso é uma característica bem feminina – as coisas mudam. O sofá já não é tão legal. Os canteiros cultivados em anos de trabalho, brigas com jardineiros preguiçosos e tias solteiras, voltam a sofrer ameaça de despejo. Até a disposição de porta-retratos, ou o aroma do perfume passam a ser questionados pelas sensíveis narinas delas.
Vida a dois tem um preço alto. As mulheres enjoam do que antes lhes eram belo, cheiroso e gostoso. E os homens, ou ganham barriga, ou se entregam às academias para agradar donas de seus corações. É preciso talento para resistir às pressões, pois só amor não basta. Toda mulher é alfa. Diz que sonha com um macho forte e decidido, “de pegada”, mas dobra qualquer um.
Uma colega leu a abertura desse artigo e acusou: “Ele está se fazendo de vítima. Homens adoram se fazer de submissos para fugir dos compromissos”. Ela tem uma ponta de razão, O submisso é o cara que discorda e não reage, o que é bem diferente deste relato. A obra de arte em questão, permaneceu em casa. Mas trocou de ambiente. Saiu da sala para a varanda.
Ou seja, minha dica, para um final feliz na comédia romântica do cotidiano é negociar sempre com muito tato e sensibilidade. De ambas as partes, macho e fêmea alfas que se controlem. Negociar a crise sempre evita estresse “Lutar pelo amor é bom, mas alcançá-lo sem luta é bem melhor,” disse Shakespeare.