Meu sonho de guri era estudar para morar numa cidade grande com oportunidades para exercer uma profissão e usufruir das coisas boas da vida. Todos os exames vocacionais que fiz – na Escola Luterana São Paulo e no Colégio São Miguel – foram implacáveis: comunicação era, mesmo, o meu destino. E assim se fez.
Com determinação, apoio da família e de alguns professores, consigo até hoje sobreviver do meu trabalho, daquilo que mais gosto de fazer: ser jornalista. O tempo passa, a gente amadurece/envelhece, alteram-se as prioridades. Depois de décadas numa grande metrópole – para os padrões gaúchos – é hora de repensar.
Qualidade de vida, finitude humana, abertura de espaço para jovens profissionais. São alguns pensamentos que permeiam o imaginário de quem há mais de 40 anos – repito – faz o que gosta: comunicar, conhecer pessoas, lugares novos.
A vontade de sossegar numa comunidade mais calma – talvez até Arroio do Meio, por que não? – esbarra no temor de não me acostumar outra vez à calma contrastante com o burburinho de Porto Alegre. As noites calmas, com horário de descanso da sesta e comércio fechado ao meio-dia contrastam imensamente com a rotina atual.
A natureza humana é pródiga em semear dúvidas, mas avarenta em distribuir sabedoria para decidir
Medito sobre dias menos estressantes onde não é preciso planejar a hora de chegar em casa – de preferência antes do anoitecer – embora a insegurança seja democrática. Afinal, atinge a todos, em todos os lugres de forma indiscriminada.
Neste pêndulo entre o calmo e o agitado, o marasmo e o estresse, imagino o que seria, na prática, uma mudança radical. Sofro porque sou escravo da rotina, refratário a mudanças drásticas. É o que chamo de “crise da terceira idade”, em que balanços, perspectivas, análises e reflexões surjam sem convite. De dia ou no silêncio das madrugadas.
Escolher a hora de reduzir o ritmo e mudar com equilíbrio é uma encruzilhada, companheira cada vez mais assídua. Quando ele me encara desvio o olhar e penso:
– Ei, tu aí… volta mais tarde, senão te guardo na gaveta do esquecimento. Não me chateia!
Mesmo em fuga, sou sabedor de que ali adiante, na próxima esquina, vou deparar com a dúvida e a vontade, o medo e a hesitação. A natureza humana é pródiga em semear dúvidas, mas avarenta em distribuir sabedoria para decidir.