No último ano, no país, o mercado ilegal gerou R$ 150 bilhões em perdas nos setores produtivos como tabaco e vestuário, mais a sonegação de impostos. Neste período, a Receita Federal bateu recorde de mercadorias apreendidas no Rio Grande do Sul. O valor dos produtos retidos pelo fisco ultrapassou R$ 100 milhões, dobrando o desempenho de 2018. Mesmo assim, especialistas defendem maior foco e sintonia de ações entre Poder Público, órgãos fiscalizadores e polícia para coibir a prática que prejudica a economia legal e o desenvolvimento sócio-econômico.
Há muitas queixas de um desiquilíbrio fiscal, entre o comércio tradicional, negócios virtuais, ambulantes e micro empreendedores individuais (Meis), além do envolvimento indireto com vendas de produtos sem procedência legal, que fortalecem a criminalidade. O sinal de alerta é um suposto aumento da participação das facções no mercado de consumo. Estas organizações, não estariam controlando somente o jogo do bicho, distribuição de drogas e tabaco, mas também o fornecimento de gás e alimentos em alguns bairros, sem citar outros artigos, inclusive no Vale do Taquari.
Como forma de instrumentalizar medidas, em 12 de dezembro a prefeitura de Lajeado, por meio do decreto 11.353 /2019, proibiu as atividades de comércio ambulante em determinadas vias e logradouros públicos do município, que é considerado o polo comercial da região. A fiscalização tem apoio dos agentes de trânsito.
Na visão de especialistas ligados ao setor, a medida de Lajeado indiretamente vai impactar na rotina dos municípios vizinhos, que tendem a absorver essa prática, caso não adotem medidas semelhantes.
No entanto, alguns gestores da região afirmam que leis mais rígidas esbarram nas legislações federal e estadual, e a Receita Federal acaba fiscalizando apenas o “grosso”. Ao mesmo tempo citam a vulnerabilidade das fronteiras e cultura de consumo.
Em Arroio do Meio, de acordo com o secretário da Fazenda, Márcio Zimmer, a atuação de ambulantes é considerada tolerável. Em 2019 a prefeitura recolheu R$ 3,6 milhões em Impostos Sobre Serviços (ISS), entre os dois mil CNPJs existentes, o que é considerado positivo.
Zimmer destaca que batateiros, verdureiros, vendedores de redes, entre outros acabam pagando um alvará para atuar em território municipal. Já os ambulantes que atuam no Centro, são fiscalizados com recorrência. “São atividades sazonais. No verão, a maioria dos ambulantes está no litoral”, revela.
O secretário também observa muitos casos em que os ambulantes atuam pela sobrevivência, onde uma interferência mais incisiva poderia infringir as leis dos direitos humanos.
População precisa ser informada dos riscos
O secretário da Indústria, Comércio e Turismo de Teutônia, Sidnei Eckert, ex-prefeito de Arroio do Meio, entre 2009 e 2016, destaca a necessidade de revisão de impostos estaduais e federais em diversos produtos, inclusive em cigarros e bebidas, para voltar a atrair os consumidores, aumentar a arrecadação e enfraquecer o crime organizado. “O consumo do cigarro diminuiu nas últimas décadas porque o Governo Federal acertou nas políticas de saúde pública. Mas há um exagero em diversos impostos”, pontua.
Com 43 anos de experiência no comércio, Eckert, acredita que as entidades de classe e empresas devem pressionar as câmaras de vereadores e prefeitos continuamente, para que a repressão ao contrabando ocorra em tempo integral. “Hoje as queixas se restringem apenas às vésperas do Dia das Mães e Natal, o que não motiva um foco específico”, comenta.
Segundo ele, a vinda da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco) à região, possibilita mais inteligência nas ações investigativas, porém, as prefeituras precisam fazer o trabalho de rua, para detectar situações irregulares com agilidade, pois além do comércio ambulante o contrabando tem penetração no comércio convencional. Paralelamente, o cruzamento de dados da Receita Federal, poderá distinguir a idoneidade do patrimônio e a movimentação financeira de suspeitos.
Sobre questões de direitos humanos, o ex-prefeito é categórico ao dizer que na região existem oportunidades suficientes de emprego formal fora da clandestinidade. “Em muitos casos a própria população defende o ilegal, argumentando que é preciso deixar as pessoas trabalharem. Vejo um equívoco. Possivelmente pela falta de informações para discernir a importância de valorizar produtos idôneos com nota fiscal, que podem ser rastreados, dos itens que fortalecem o crime organizado. Não adianta pedir mais asfalto, vagas na creche e saúde de qualidade, e continuar comprando produtos clandestinos”, salienta.
Em sua ótica, políticas de valorização do comércio, por meio da exigência de nota fiscal, não dão resultado a curto prazo e devem ser inseridas na educação de base.
